sábado, 1 de agosto de 2015

PRETO E BRANCO



"Não há homem justo sobre a terra, que faça o bem e que não peque" (Eclesiastes 7:20).

Ao escrever Maciez, não pensei em outro mal que me tentasse continuamente ao pessimismo senão no próprio homem. A maldade está tão arraigada ao homem que chego a questionar se a desumanidade é realmente des-humana. Mas para mim é dogma de fé a existência de uma verdade bela em todas as realidades, por mais hostis que se nos revelem. Está claro para mim que a desumanidade é de fato des-humana, pois a verdade sobre o homem não há de ser diferente. 
As Escrituras me deixam claro que o homem é mau por natureza. Mas ainda que não houvesse as Escrituras para me informarem isso, a própria experiência se encarregaria de fazê-lo. 
Com o perdão da palavra, quem acredita na bondade humana é um romântico e ingênuo, que até hoje não sabe o que é verdadeira bondade. Essa é a minha opinião a respeito. O único homem realmente bom é Jesus Cristo. Todos os outros que existiram e existem são maus.
Se você acha que estou sendo muito radical, convido-lhe a fazer um experimento: vá e recompense com indiferença e ultraje a próxima pessoa a lhe prestar algum auxílio. Depois veja no que isso vai dar. 
Só a indiferença de quem servimos basta para tumultuar nosso coração mau, obrigando-nos a censurá-lo duramente, se quisermos continuar fazendo o bem. Que se dirá de quem nos retribui o favor com traição ou qualquer outra ofensa? É nessas horas que a máscara da bondade cai. Quando aparece um raro espírito que age bondosamente com quem lhe fere, é certo que isso lhe custa caro e só é obtido mediante renhida luta interior. Se essa luta existe, é porque essa pessoa não é boa por natureza. Deus não luta consigo mesmo ao agir bondosamente com seus ofensores, porque ele sim é bom.Como disse Jesus: "Ninguém é bom senão um, que é Deus" (S. Marcos 10:18).
Mas não podemos ir excessivamente longe nessa conclusão de que o homem é mau. Tudo o que Deus criou é bom: "viu Deus tudo quanto fizera, e eis que era muito bom" (Gênesis 1:31). Esse versículo bíblico é para mim a chave da verdade. Tudo o que Deus criou é bom. Se houver algo que não seja bom, não foi Deus quem fez.
A filosofia nos ensina que tudo consiste de substância e acidentes. Substância é a verdade de cada coisa. Os acidentes são as roupas que vestem essa verdade. Por exemplo, a verdade da madeira é que ela é madeira, seja ela velha ou nova, valiosa ou desprezível, forte ou fraca. Algo é comum a toda madeira, que é a sua verdade ou substância. A substância da madeira a torna madeira e a diferencia do plástico, da pedra e da água. Como as madeiras são diferentes entre si, tudo o que as distingue uma da outra é chamado de acidente.
Pois bem, devemos entender que o mal ou pecado está no homem não como algo substancial, mas acidental. A substância do homem é boa, assim como são boas todas as substâncias que Deus criou. Se o pecado entrou na humanidade e a perverteu profundamente, entenda que pecado e perversão são acidentes. A água não deixa de ser água quando está poluída por esgoto. Por isso é correto afirmar que o homem é mau, assim como dizer que ele é bom.
Mas em termos práticos, que diferença faz pensar assim? Uma vez posto que o homem é mau por natureza, que importância tem saber se essa maldade é substancial ou acidental? 
A busca da verdade tem que ter repercussões práticas, caso contrário ela se torna especulação infértil. Quando afirmo que o homem é bom segundo a criação e que o pecado está nele como acidente, minha maneira de enxergá-lo muda. O que é substancialmente mau nunca será bom e deve ser eliminado. Agora, se a maldade está como acidente, é possível mudança. 
Não devemos nos iludir com a aparente bondade humana, de maneira a classificar as pessoas em boas ou más. Primeiro, porque ninguém é bom de acordo com as Escrituras. Segundo, porque o conceito de bondade e maldade é histórico, social e político. A sociedade sempre fez essa distinção viciosa entre bons e maus. No entanto, nós, que somos Igreja, não devemos cair nessa. 
Um homem pode ser honesto, caridoso e até bondoso, mas isso não é ser bom, porque a bondade não está em sua natureza, mas somente em seus atos exteriores. Por outro lado, se tomamos a obra de Deus como boa e digna de respeito, então todos somos bons e dignos de respeito, inclusive Calígula, Nero, Adolf Hitler e Stalin. 
Quero, com isso, denunciar os "justiceiros do Brasil", que se sentem no direito de linchar e matar criminosos, negando-lhes o direito de julgamento e de reabilitação. Esses "justiceiros" são policiais, intelectuais sofistas e plebe manipulável. Para esses "justiceiros", a sociedade é constituída de homens bons e maus, sendo a vida coisa sagrada somente para os supostos bons. Como para sonhar não se paga nada, eu tenho um sonho de que armas só sejam colocadas nas mãos de quem estudou filosofia. Como eu gostaria que policiais e militares aprendessem, nem que seja minimamente, o que a filosofia ensina sobre o homem.
Todos somos bons e maus, tenhamos uma vida proba ou criminosa. Somos bons substancialmente, maus segundo o acidente do pecado. Isso não é diferente para com aquele rapaz linchado até à morte em Maranhão, Cleidenilson Pereira da Silva. Ele não era menos mau que nós segundo o pecado, nem menos bom que nós segundo a santa criação de Deus. 
Como afirmei acima, se a maldade humana é acidental, é possível mudança e nós, cristãos, temos que acreditar nisso. Bandidos podem mudar de vida e se tornar cidadãos dignos. E mais: podem se tornar excelentes cristãos. Lembro-me de S. Paulo encomendando a Filemon seu escravo fujão e inútil, Onésimo, com as seguintes palavras: "Solicito-te em favor de meu filho Onésimo, que gerei entre algemas. Ele, antes, te foi inútil; atualmente, porém, é útil, a ti e a mim" (Filemon 10-11).
Se irrefletidamente confessarmos que o pecado está no homem substancialmente e que não é possível mudança, então devemos parar de ensinar a ressurreição dos mortos. Se o homem é mau substancialmente, ressuscitará mau ou deixará de ser homem, ao ressuscitar bom. Agora, se o homem é mau por acidente, então Deus pode mudar sua condição, retirando dele o acidente do pecado para vesti-lo com o acidente da verdadeira bondade, para que seja bom de fato, o que esperamos que ocorra na ressurreição dos mortos. Por isso, não caia no erro de considerar alguns seres humanos verdadeiros monstros, indignos de viver, porque esse raciocínio é incoerente a um cristão. Deixe o mundo com sua segregação e faça diferença.
Quero encerrar com S. Paulo: "Eis que vos digo um mistério: nem todos dormiremos, mas transformados seremos todos, num momento, num abrir e fechar de olhos, ao ressoar da última trombeta. A trombeta soará, os mortos ressuscitarão incorruptíveis, e nós seremos transformados. Porque é necessário que este corpo corruptível se revista da incorruptibilidade, e que o corpo mortal se revista da imortalidade" (1 Coríntios 15:51-53).



Autoria: Carlos Alberto Leão.
Imagem extraída da internet.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.