sexta-feira, 31 de julho de 2015

UMA NOVA ALIANÇA



"Porque eu recebi do Senhor o que também vos entreguei: que o Senhor Jesus, na noite em que foi traído, tomou o pão; e tendo dado graças, o partiu e disse: Isto é o meu corpo, que é dado por vós; fazei isto em memória de mim.
Por semelhante modo, depois de haver ceado, tomou também o cálice, dizendo: Este cálice é a nova aliança no meu sangue; fazei isto, todas as vezes que o beberdes, em memória de mim" (1 Coríntios 11:23-25).

A instituição da Eucaristia teve um aspecto muito peculiar, que nunca devemos perder de vista: Jesus Cristo, revelação do amor de Deus por nós, estava selando conosco uma nova aliança.
A aliança que Deus fez com Moisés, quando lhe entregou os preceitos ou a Lei, chamada aliança da Lei, foi selada pelo sangue de animais. "E tomou o livro da aliança e o leu ao povo; e eles disseram: Tudo o que falou o SENHOR faremos e obedeceremos. Então, tomou Moisés aquele sangue, e o aspergiu sobre o povo, e disse: Eis aqui o sangue da aliança que o SENHOR fez convosco a respeito de todas estas palavras" (Êxodo 24:7-8).
Há uma semelhança chocante entre o que Moisés disse: "eis aqui o sangue da aliança" com o que Jesus disse: "este cálice é a nova aliança no meu sangue". Fico impressionado com isso.
A primeira aliança, firmada através de Moisés, não foi estabelecida para salvar. Em momento algum Deus prometeu remissão de pecados e vida eterna a quem a cumprisse. Quando Deus firmou essa aliança com o povo de Israel, sua promessa de salvar o homem através de Cristo, e não de outro modo, permaneceu inabalável (Gálatas 3:6-9, 16-17). 
Além disso, era uma aliança muito frágil, pois se baseava no ato humano. Como era de se esperar, ninguém cumpriu a promessa: "TUDO o que falou o SENHOR faremos e obedeceremos". O homem caído não tem condições de cumprir tal promessa, mesmo que o queira do fundo do coração. Portanto, todos os israelitas transgrediram a aliança da Lei e foram encurralados por Deus (Gálatas 3:19,22).
Entretanto, Deus não agiu maldosamente com eles. O doente precisa saber que está doente para que aceite o remédio. Quando alguns em Israel se deram conta de sua grave enfermidade e desejaram o remédio, foi que Deus começou a anunciar uma nova e eterna aliança, esta sim para remissão dos pecados e vida eterna. Assim profetizou Jeremias: "Eis que vêm dias, diz o SENHOR, em que firmarei nova aliança com a casa de Israel e com a casa de Judá (...). Pois perdoarei as suas iniquidades e dos seus pecados jamais me lembrarei" (Jeremias 31:31,34).
Jesus Cristo, verdadeiro Deus e verdadeiro homem, verdadeiro descendente da mulher, verdadeiro descendente de Abraão, selou essa aliança (Hebreus 9:15). Para tanto, não utilizou sangue de animais, mas seu próprio sangue, que foi oferecido aos discípulos através do vinho. Os discípulos não foram aspergidos por esse sangue, mas o beberam. Jesus também ofereceu seu próprio corpo sob o pão. 
Veja que a antiga aliança era temporal. O povo deveria obedecer todos os mandamentos da Lei para que fosse devidamente recompensado com bênçãos temporais (Levítico 26:3-13; Deuteronômio 28:1-13). Por se tratar de uma aliança temporal, foi selada com coisa temporal: sangue de animais. Essa aliança não pôde tocar o espírito, mas somente a carne, sobre a qual o sangue foi só aspergido. Além disso, foi firmada somente com os israelitas e não diz respeito a nós.
A nova aliança foi selada pelo sangue e pelo corpo eterno do próprio Deus que se fez homem. Esse mesmo corpo seria oferecido na cruz como expiação dos pecados, bem como o sangue. Essa nova aliança não se baseia no homem, mas na misericórdia divina, que nunca acaba, que se renova diariamente, que não se cansa, que é imutável e incondicional. Deus não depende do homem para continuar sendo quem é. Por isso, essa nova aliança, que podemos chamar de aliança da Graça ou aliança do Evangelho, é perene, assim como Deus é perene. A participação humana nessa aliança é totalmente receptiva. Em aspecto algum podemos afirmar que ela seja ativa de nossa parte. Por isso mesmo veio para ficar e não será rompida nunca. Ademais, não é uma aliança nacional, mas universal, não excluindo ninguém.
Para demonstrar de maneira dramática que essa nova aliança é puramente receptiva de nossa parte, Deus nos deu para COMER e BEBER seu verdadeiro corpo e seu verdadeiro sangue. Não quis que seu sangue ficasse sobre nossa pele, mas desejou que entrasse por nossa boca e atingisse nosso coração, nosso âmago e enchesse nossa fé sobejamente de tudo o que ele é.
Venho pensando muito, ultimamente, sobre a conversa que Jesus teve com seus discípulos após a primeira Eucaristia, muito bem detalhada por S. João. Jesus disse: "Porque eu vivo, vós também vivereis". Essa doce Palavra de Jesus encheu de alegria a minha semana.
Jesus selou a nova aliança com seu próprio ser, com sua própria vida. Sabemos bem o que significa o sangue para o povo judeu: vida! A vida de Deus deve ser engolida para exterminar nossa morte. Sua vida se funde à nossa vida, tornando-se o maior penhor que já existiu. Que garantia maior você quer de Deus de que é amado por ele e que viverá eternamente com ele, do que ter em você a própria vida de Jesus?
Se eu, ao morrer, perecer para sempre, comigo perecerão o corpo e o sangue de Cristo, que hoje fazem parte de mim. Mas isso não é possível. Davi profetizou: "Alegra-se, pois, o meu coração, e o meu espírito exulta; até o meu corpo repousará seguro. Pois não deixarás a minha alma na morte, nem permitirás que o teu Santo veja corrupção" (Salmo 16:9-10). Todos sabemos que Santo é esse. É o mesmo Santo que se torna literalmente um conosco quando o engolimos. Deus não permitirá que seu dileto Filho se perca para sempre, juntamente com nossa carne e espírito.
Acredito que por isso Jesus ordenou que essa mesma aliança fosse repetida pelos cristãos até o último dia. Todo cristão deve ser lembrado frequentemente que seu Deus firmou uma nova aliança consigo e que dá seu próprio corpo e seu próprio sangue como garantias de que essa aliança não será violada. Deus não deixará perecer quem agora é uma só carne com Cristo. E não afirmo isso de maneira figurativa ou poética, mas de maneira literalíssima. Através da Eucaristia, Deus consuma seu matrimônio com a Igreja.
É tão bom quando nos flagramos poéticos ao tratar da realidade! 



Autoria: Carlos Alberto Leão.
Imagem extraída da internet.

sexta-feira, 24 de julho de 2015

MACIEZ



Viver não é fácil; é um desafio de todos os dias. Mas a vida existe e é muito boa em si mesma.
Se viver é nossa condição, por que não viver da melhor maneira que pudermos? Como disse o poeta: "É melhor ser alegre que ser triste". Não podemos permitir que o pessimismo nos enrede e aprisione.
Os tempos são tão difíceis e o ser humano está tão perdido, que hoje enaltecemos como verdadeira sabedoria raciocínios pessimistas e inférteis acerca de tudo. Otimismo para nós é coisa de fracos.
Mas desde quando sabedoria se tornou praticamente um sinônimo de pessimismo?
Todos sabemos o quão árdua é a existência. Carregamos o fardo da existência todos os dias. Não temos férias de nós mesmos. Mas nem por isso teremos que viver uma vida triste e infrutífera.
As coisas são o que elas são: nem tão boas, nem tão ruins. Minha opinião sobre elas não irá mudá-las em nada. Mas o que penso acerca delas pode gerar mudanças em mim, seja para melhor, seja para pior. Por isso é muito necessário analisarmos a nossa realidade e as realidades que nos cercam com otimismo.
Otimismo não é ingenuidade nem alienação. Otimismo é a busca da verdade oculta em tudo o que há no mundo, sobretudo nas tragédias, desgraças e frustrações. Porque se vejo somente tragédia, desgraça e frustração, não terei alcançado a verdade. 
Se a busca da verdade começa pessimista, ela deverá terminar otimista, caso contrário não se terá chegado ao cerne da questão.
De onde me vem a convicção de que o pessimismo não é realista, nem comprometido com a verdade? É que a única verdade que existe é boa. Não queira acreditar que a verdade é ruim. A casca pode o ser, mas não o cerne.
Quem ousaria chamar a vida de desgraça? Até mesmo nos mais miseráveis, ela é muito valiosa. E tudo é vida. Se tudo é vida e a vida é, em si, algo bom, então tudo é bom. Se eu enxergar somente o mau, certamente não enxerguei tudo o que deveria enxergar. Aliás, se eu enxergar somente o mau, não terei ultrapassado a casca. Isso sim é coisa de fraco!
O otimismo é o esforço humano, comprometido com a verdade, de alcançar a bondade que está presente em cada realidade.
"Viu Deus tudo quanto fizera, e eis que era muito bom". De fato, tudo o que Deus fez é bom em si. O pecado deformou as realidades e nossa visão delas, mas a essência de cada realidade é vida, vida de Deus e algo "muito bom".
Acho linda a luta pela sobrevivência que existe nos refugiados de guerra. É muito bela a criatividade que surge na pobreza. Como já afirmei em outra publicação, não há palavra mais linda que solidariedade, que só é mencionada em meio à desgraça. Quão bela é a procriação, mesmo em cenários hostis. Que coisa encantadora é o perdão, que somente a ofensa enseja. Coisa delicada é ver familiares se reaproximando e reatando antigos laços, movidos pela angústia da perda. 
Embora a vida passe frenética, as flores não são de plástico, porém muito vivas, à espera de um olhar. Elas não existem para si mesmas, mas para nosso deleite. Também o frescor da água não existe para a água, mas é doação e generosidade. Nem a uva tem a obrigação de se tornar vinho, mas o faz para que nos alegremos. Que lucro tem o alimento em ser saboroso? Ele poderia somente saciar a fome e estaria de bom tamanho. No entanto, ele se doa em muitos sabores aprazíveis. A atmosfera não precisava ter um azul tão límpido, nem nos surpreender com seus matizes violetas, quando o sol se põe. Em tudo isso vejo generosidade, doação e vida. 
Então trago isso para a nossa realidade. Não é generoso o sorriso de quem nos serve? Deveria somente nos servir, mas nos serve com um sorriso. As mulheres poderiam somente engravidar e parir, como o fazem os animais. No entanto, elas são amadas, tornam-se mães e dão à luz, o que é bem diferente de parir. Um professor poderia somente alfabetizar e instruir. Mas quantas vezes um professor nos faz ver o potencial que nós temos, descortina-nos o horizonte e apresenta-nos possibilidades? Ele não foi pago para fazer isso. Mas o faz por amor. O médico e enfermeiro também não são pagos para consolar, tocar e compadecer-se, mas o fazem gratuitamente. E assim por diante, em todas as profissões, percebo que muitos se doam generosamente, indo além do que é obrigação. Isso é vida!
Veja que Deus deixou um rastro em tudo o que fez. Em tudo há vestígio de vida. Pelo menos por enquanto. 
Se sua visão lhe apresentar somente morte, entenda que não chegou ainda à verdade. A verdade é sempre Deus e ele é vida e ele é bom.
Só teremos chegado à verdade de uma realidade quando a olharmos e dissermos da mesma maneira que Deus: Isto é muito bom!



Autoria: Carlos Alberto Leão.
Imagem extraída da internet.


domingo, 19 de julho de 2015

O ÓPIO DO POVO




"Sabemos que, se a nossa casa terrestre deste tabernáculo se desfizer, temos da parte de Deus um edifício, casa não feita por mãos, eterna, nos céus. E, por isso, neste tabernáculo, gememos, aspirando por sermos revestidos da nossa habitação celestial" (2 Coríntios 5:1-3).

Acabo de retornar do culto. Ali me encontrei com o meu Amado, que me tomou como criança em seu regaço e amorosamente me absolveu de toda a culpa. Depois acariciou meus cabelos, enquanto falava comigo e, por fim, beijou-me através do Sacramento do Altar. Momentos de êxtase, que me aliviam o fardo da existência. 
Alguém disse que religião é o "ópio do povo". Essa pessoa queria dizer que o povo se anestesia de suas dores cotidianas através da religião. Não vou discordar dessa pessoa totalmente. Eu lamento o cinismo dessas palavras, mas não o seu conteúdo cru.
De fato, não há precariedade maior do que ser humano neste mundo. Somos como os animais, com um enorme diferencial: temos a percepção de nossa realidade e das realidades que nos cercam. Temos um espírito que geme dentro de nós, querendo algo que não podemos lhe dar. Somos muitos, mas estamos sempre sozinhos. Sobre nós está a expectativa da morte, não como fenômeno, mas como terror, como sinônimo de juízo. Criamos a filosofia para aliviar esse fardo de existir, mas os filósofos nos atolaram ainda mais em nossa precariedade, não apresentando solução alguma para o nosso dilema. Nossa existência aqui é verdadeiro inferno.
O ópio, por sua vez, alivia. Pode ser um narcótico, utilizado com o intuito de nos desconectar da realidade de nós mesmos e do mundo, mas pode ser utilizado para acalmar e para aliviar a dor. A religião pode ser um narcótico, quando nos ensina a alienação das obras e da justiça própria. Ela, porém, se torna ópio medicinal quando nos conduz a Deus e nos põe a descansar em seus braços, nem que seja por alguns minutos.
No texto acima, São Paulo trata da precariedade de nossa existência neste mundo e fomenta a esperança em uma realidade superior, em que não mais haverá pecado, nem medo, nem juízo, nem solidão, nem dor. A essa esperança os cristãos se agarram e, por causa dela, abandonam o resto. Até porque esse resto não vale tanto assim. Aliás, não vale nada.
Vou à igreja em busca de meu ópio, que me faça suportar esta minha peregrinação, que me faça aguentar viver com minhas feridas, até o dia em que esse ópio não mais será necessário. 
Sabe, vejo muita inveja no mundo contra esse ópio. Todos gostariam de ter o que a fé nos proporciona, como cristãos. Quando veem um cristão indo à igreja para receber seu ópio, revoltam-se e consideram isso uma grande e insuportável tolice, que a sociedade não deveria tolerar em seu meio. Tudo isso é inveja.
Gostaria eu que todos cressem e provassem o que provo. Deus está entre nós, oferecendo o que há de mais precioso no universo como se fosse pipoca e amendoim torrado nos semáforos. Aliás, está nas praças como aqueles palhaços que nos fazem parar para que entremos e vejamos o que há na loja a ser vendido. A diferença é que esse palhaço não quer que compremos nada. Quer somente que paremos, ouçamo-lo e recebamos de graça o que ele já comprou. Nós, porém, o ignoramos e vamos buscar coisa melhor em nossa própria imundície. 
Lamento muito a situação do homem.
Como me disse Jesus: "Deixa aos mortos o sepultar os seus próprios mortos. Tu, porém, vai e prega o reino de Deus".


Autoria: Carlos Alberto Leão.
Imagem extraída da internet.

sábado, 18 de julho de 2015

O ACALENTO DA UNIDADE


"Não rogo somente por estes, mas também por aqueles que vierem a crer em mim, por intermédio da sua palavra; a fim de que todos sejam um; e como és tu, ó Pai, em mim e eu em ti, também sejam eles em nós" (João 17:20-21).

Depois do desabafo "O desamparo da individualidade", minha alma, mais afogueada que nunca, buscou um consolo em Deus. Como me livrar da individualidade? Onde posso sustentar minha esperança? Porque esse desejo, livrar-me da individualidade, não deve ser devaneio. Tenho a esperança de que minha vida com Deus me tenha trazido a esse desejo.
Foi então que me lembrei de dois artigos de fé: Santíssima Trindade e Comunhão dos Santos.
Como eu encontrei consolo nesses dois artigos de fé! No versículo acima, está um trecho da oração de Jesus antes de seu sacrifício, quando estava junto aos seus amigos, ceando com eles, despedindo-se deles.
Um dia não serei eu, mas junto à Santíssima Trindade e a todos os santos, serei um infinito nós.
Na Santíssima Trindade, confessamos três pessoas, mas não três indivíduos. Pai, Filho e Espírito Santo não estão desconectados, cada qual com sua existência, opinião, tarefa, projetos e dores. Tudo é vivenciado pelas três pessoas como por um único indivíduo. Não estão desamparados, sozinhos em si mesmos, como seria o caso de três amigos ou de três reis governando um império. Eles são um só indivíduo, com o mesmo pensamento, com o mesmo desejo, com os mesmos sentimentos, absolutamente um.
Mas Jesus pede ao Pai que a Cristandade seja uma com a Trindade Santa. É aqui onde me consolo. Um dia não serei eu, Carlos Leão, médico, esposo, amigo, filho, colega de trabalho, cidadão brasileiro, cidadão do mundo, luterano, membro da Igreja Evangélica Luterana do Brasil, com uma personalidade única, com sonhos só meus, com projetos só meus, prostrado sob expectativas, olhares e julgamentos, mas deixarei de ser tudo isso, para ser um indivíduo com a Santa Igreja Cristã e com a Santíssima Trindade. É esta a esperança que guardo no coração para a eternidade com Deus. É esta a eternidade que eu anseio.
A partir desse meu consolo, intuo também a realidade do inferno: pessoas arrastando seus corpos e almas, sozinhas e perdidas em sua individualidade para sempre. Somente a expectativa disso me horroriza. Imagine viver para sempre a vida que temos aqui! Haveria tormento maior que esse? Acredito que não. E é exatamente isso o que penso com relação ao mal que há de vir sobre o mundo.



Autoria: Carlos Alberto Leão.
Imagem extraída da internet.

quinta-feira, 16 de julho de 2015

O DESAMPARO DA INDIVIDUALIDADE


Quisera eu não ser eu, quisera eu não ser outro. Quisera eu não sentir que existo. Quisera eu ser um mero expectador de não sei o quê.
Ser adulto não é fácil. Sou oprimido pelas minhas expectativas, sou oprimido por expectativas alheias reais, supostas ou deliradas; não sei dizer. Só posso afirmar que para mim são reais. Gostaria de me livrar dessa adultice de uma vez por todas. Gostaria de não sentir meu corpo, de não sentir seus desconfortos, de não suar, de não defecar, de não urinar, de não comer, de não respirar, de não precisar o tempo inteiro. Esse meu corpo parece uma roupa apertada. Minha alma tímida e desconfiada é tão pesada quanto aço. Gostaria de saber quem incomoda mais quem: se meu corpo incomoda minha alma ou se minha alma incomoda meu corpo. São dois desconfortos. Gostaria de saber quem dos dois se sente mais sobrecarregado. Mas se souber, o que poderei fazer? Deixe pra lá! 
Há dias em que todas as flores são de plástico. A comida parece ser uma matadora de fome. A água parece ser uma matadora de sede. O ar parece ser um enchedor de pulmões. Nesses dias, eu sinto a minha respiração. Odeio senti-la! Nesses dias a vida parece tão artificial que me sinto um boneco. Há dias em que o meu mundo parece uma cela. Há dias em que sou um hamster na rodinha.
Mas o hamster não tem consciência de nada. Pelo menos é o que eu acho. Eu, porém, tenho uma maldita consciência de que sou um hamster na rodinha. Mas é pior que ser um hamster na rodinha, porque ele não tem outras tarefas senão comer, beber, dormir e girar a rodinha. Quanto a mim, eu vejo expectativa por todo lado. Girar a rodinha é pouco; tenho que ser um GRANDE girador de rodinhas.
Por que tenho que ser tão material, tão duro, tão visível, tão exposto, tão dolorido, tão sufocado, tão pensante? Mas não posso consentir em ser diferente do que sou, mesmo se tivesse poder para isso.
Cada um imagina o Céu de um jeito. Para mim o Céu é existir como se não existisse, é não se sentir, é não ter consciência da existência, é não ser. Acho que só assim me apeteceria a vida eterna. Vida que não esteja sozinha, partida, separada, cônscia de si. Não considero a consciência algo ruim. Para mim o tormento está na consciência de mim mesmo.
É nessas horas, quando sinto o fardo da adultice, do desamparo da individualidade e da existência, é que invejo os insanos como verdadeiro protótipo da bem-aventurança. Eles sim parecem existir como se não existissem.



Autoria: Carlos Alberto Leão.
Imagem extraída da internet.


sábado, 11 de julho de 2015

VIDA



Vida
Intrépida ousadia
Vida
Dama que sai
Vida 
Rio que corre
Vida
Onda que se arrebenta
Vida
Ilusionista bailarina
Vida
Alegria de um palhaço
Vida
Penetra na festa
Vida
Estrela que cai
Vida 
Vento das rosas
Vida
Cadência do caos
Vida
Etérea Aveludada
Vida
Cabra-cega
Vida
Itinerário de vagabundo
Vida
Vid... 
Vi... 
V...
. .  .
Um sopro.



Autoria: Carlos Alberto Leão.
Imagem extraída da internet.

sexta-feira, 10 de julho de 2015

VIDA: A DÁDIVA DE DEUS


"Criou Deus, pois, o homem à sua imagem, à imagem de Deus o criou; homem e mulher os criou. E Deus os abençoou e lhes disse: Sede fecundos, multiplicai-vos, enchei a terra e sujeitai-a; dominai sobre os peixes do mar, sobre as aves dos céus e sobre todo animal que rasteja pela terra. E disse Deus: Eis que vos tenho dado todas as ervas que dão semente e se acham na superfície de toda a terra e todas as árvores em que há fruto que dê semente; isso vos será para mantimento. E a todos os animais da terra, e a todas as aves dos céus, e a todos os répteis da terra, em que há fôlego de vida, toda erva verde lhe será para mantimento. E assim se fez. Viu Deus tudo quanto fizera, e eis que era muito bom. Houve tarde e manhã, o sexto dia" (Gênesis 1:27-31).

Está chegando meu aniversário. É a data mais especial para mim, porque é a celebração de minha vida. Acho muito justo reservar um dia para agradecer a Deus o dom de minha existência e refletir acerca dela.
A vida é "A" dádiva de Deus, seu único propósito para nós. Todo o mais que recebemos dele é para manutenção dessa vida.
Deus é vida, vida que não se pode conter. Aliás, vida nunca pode ser contida. Essa vida de Deus se expressou na criação de todas as coisas. Tendo criado todas as coisas, quando as contemplou, alegrou-se com a beleza de sua vida. Essa mesma vida se expressa na manutenção de tudo o que existe. Portanto, todas as criaturas são a materialização da vida de Deus.
Nós também somos criativos e apreciamos nossas criações. E por que as apreciamos? Porque elas materializam nossa existência e são elas que irão imortalizar nossa existência também, neste mundo e no por vir. O mesmo penso de Deus, que se deleita em contemplar o que fez, por ver na sua criação sua própria vida, sua existência.
Seria tão bom se aprendêssemos a ver também na criação a existência de Deus! Fico triste ao perceber que as pessoas mais cultas do mundo, que tanto se aprofundam em estudar o universo, não conseguem enxergar a vida de Deus nele. Veja quão pecador é o homem! Veja quão perversa se tornou a razão humana! Os maiores teólogos deveriam ser aqueles que tanto se aprofundam nas ciências naturais. Entretanto, são os mais ateus que existem.
Deus nos deu consciência de sua vida e a responsabilidade de zelar por ela. E aqui temos falhado muito. 
A vida de Deus está em tudo. Ela está nos dias, nos anos, nas estações, na morte, na ressurreição, na transformação, na procriação, na criatividade, no pensamento, na ordem, nas leis, nas autoridades, em absolutamente tudo o que existe de bom. Deveríamos estar cuidando de tudo isso. Mas o que temos feito? Eutanásia, suicídio assistido, legalização do aborto. O que fazemos, além disso? Estamos querendo destruir o matrimônio, a vida que somente a união entre homem e mulher pode gerar, as principais estruturas que incutem em nós o amor de Deus, a ética e a moralidade, que são a família e a religião; temos impedido a procriação, através de leis de controle da natalidade. Temos pelejado contra tudo isso! 
O que temos feito com a vida de Deus? Nós a estamos destruindo em nós mesmos através da prostituição, das drogas, da sobrecarga de trabalho, da falta de tempo para a família e para as amizades, da falta de tempo para si mesmo e para Deus. 
O que mais temos feito? Ajude-me! Estamos consumindo de maneira irresponsável e egoísta os recursos naturais, estamos nos erguendo às custas da queda dos outros, estamos destruindo os nossos pobres, massacrando-os até. Nossa vontade é retirar os pobres de nossa vista, porque eles são para nós estorvo, perigo e conflito de consciência. Só que esses pobres somos nós. Quando a sociedade investe contra os pobres, está investindo contra si mesma.
A pior coisa que temos feito contra a vida de Deus, porém, não é nada disso. Tudo isso é somente consequência. A causa é a destruição do próprio Deus. Não queremos mais Deus em nossa sociedade. É por isso que estamos investindo contra a vida, porque Deus é vida e sua vida está em tudo o que é bom. Quem se propõe a matar Deus, terá que matar tudo o que é bom, inclusive a si mesmo.
Foi-se o tempo em que buscávamos a verdade, a redenção, a virtude, nós mesmos e o outro. Hoje não queremos nada disso. Aliás, estamos destruindo tudo isso, porque tudo isso cheira a Deus.
Eu amo a vida. Não foi à toa que decidi ser médico. Não acredito em vida ruim. Eu acredito em vida sem sentido, sem propósito. Eu gostaria de desafiar cada leitor meu (e sei que são poucos, infelizmente)a se conscientizar que essa vida que tem é fôlego de Deus, é vida de Deus. Meus amigos, nós somos materialização da vida de Deus, estamos cercados por ela. Mas como afirmei, a vida é dinâmica. Ninguém pode contê-la. Portanto, sua vida tem um propósito e esse propósito é gerar mais vida. Você foi feito à semelhança de Deus, cujo propósito é viver e gerar vida. Por que nos mutilamos, querendo retirar de nós essa imagem e semelhança de Deus?
Que não sejamos encontrados destruindo a vida, mas gerando-a e conservando-a com prazer, tendo por referencial o prazer de Deus ao nos gerar sujeitos, pessoas, sociedade, mundo e universo.



Autoria: Carlos Alberto Leão.
Imagem extraída da internet.



sábado, 4 de julho de 2015

MEDO DA SOMBRA



"Quando entre ti houver algum pobre de teus irmãos, em alguma das tuas cidades, na tua terra que o Jeová, teu Deus, te dá, não endurecerás o teu coração, nem fecharás as tuas mãos a teu irmão pobre; antes lhe abrirás de todo a tua mão e lhe emprestarás o que lhe falta, quanto baste para a sua necessidade. Livremente, lhe darás, e não seja maligno o teu coração, quando lho deres; pois, por isso, te abençoará Jeová, teu Deus, em toda a tua obra e em tudo o que empreenderes. Pois nunca deixará de haver pobres na terra; por isso, eu te ordeno: livremente, abrirás a tua mão para o teu irmão, para o necessitado, para o pobre da tua terra" (Deuteronômio 15:7-8, 10-11).

Hoje Deus iniciou um diálogo comigo na padaria. Esse diálogo terminou minutos atrás.
Na entrada da padaria, havia uma senhora com duas crianças, pedindo esmola. Comprei os pães para mim e minha esposa e pensei em algo que pudesse dar àquela senhora e aos seus filhos para comer, algo que fosse possível comer sem necessidade de bebida. Então comprei dois pacotes de pãezinhos de coco, bem docinhos e molhados. Quando dei a sacola com os pães àquela senhora, sua filhinha se dirigiu imediatamente ao embrulho, exclamando: Hummmmm!
Enquanto voltava para casa, pus-me a pensar naquela criança e em seu irmãozinho: sem oportunidades, malnascidos em todos os aspectos, sem liberdade e com cidadania fictícia, eles provavelmente serão usuários de droga e bandidos daqui a 10 anos.
Nós nos queixamos da falta de segurança, vivemos trancados em nossas casas e em nossos carros, não temos paz. O mundo inteiro vive sob o regime do medo: seja do usuário de droga, seja de bandidos ou de terroristas. Então culpamos os governos, cobramos deles maior segurança, mas nos esquecemos de nossa responsabilidade em toda essa desgraça que está ocorrendo no mundo.
Nossa sociedade é injusta. Não só a sociedade brasileira, mas todo o mundo. Temos desprezado os nossos pobres. São eles que nos impõem medo, assaltam-nos, matam-nos, tornam-se terroristas e nos trazem dor de cabeça. Quem tem ouvidos para ouvir, ouça! Tudo isso tem sido consequência de nossa omissão, desprezo, indiferença, ganância e materialismo. Nós estamos criando as pessoas que irão nos intimidar, roubar e matar. 
É fácil culpar os governos e as próprias pessoas que entram no mundo do crime. Difícil é assumir nossa responsabilidade nisso. Aqui não penso em organizações humanitárias, em grandes obras filantrópicas, mas na maneira como você remunera e trata a sua empregada doméstica, na maneira como você lida com os seus funcionários, na maneira como você trata o mendigo e se você se importa ou não com o problema que chega até você. Eu penso em pequenas coisas, que podem se tornar grandes.
Enquanto nossa sociedade permanecer assim, desobediente a Deus e individualista, desprezando os mais fracos, não haverá paz. O dinheiro que recusamos dar ao nosso irmão pobre teremos de gastar com cercas elétricas, portões elétricos, alarme, carros blindados, câmaras, seguros, etc. O que o mundo recusa investir em justiça social terá que obrigatoriamente investir na luta contra as imigrações e terrorismo.
Com a Palavra de Deus não se brinca. Deus conhece a consequência de cada coisa que nos proíbe e, por isso mesmo, nos proíbe. Igualmente se deve dizer acerca do que ele ordena.
Quero concluir citando o profeta Isaías: "Ah! Se tivesses dado os ouvidos aos meus mandamentos! Então, seria a tua paz como um rio, e a tua justiça, como as ondas do mar. Para os perversos, todavia, não há paz, diz Jeová" (Isaías 48:18,22).



Autoria: Carlos Alberto Leão.
Imagem extraída da internet.