quarta-feira, 12 de agosto de 2015

MOISÉS E JESUS - PARTE 3



O Evangelho é poderoso demais! Ele cai no coração como brasa viva sobre palhas secas ou como boa semente em terra fofa. É claro que para a folha secar e tornar-se palha será necessário o calor fustigante da Lei. Também a terra do coração só é afofada pelo arado da Lei.
Quando uma pessoa se sente oprimida pela consciência de seu pecado, isso significa que o arado da Lei já passou por ali. Basta  então que a semente do Evangelho seja lançada na terra fofa do coração para que germine em fé. Aqui não se há de falar em predestinação. Deixe isso para os filósofos! O Evangelho produz a fé e isso deve ser compreendido objetivamente. Ele só não cumprirá o seu propósito quando houver resistência de nossa parte (Atos 7:51). 
Infelizmente, esse só é muita coisa. Quando a semente do Evangelho toca o coração do homem com o propósito de ali germinar, o homem arregimenta todo o seu bom senso, sua razão, sua petulância, sua sabedoria e tudo o que existe em si de carnal para pegar essa semente e arremessá-la para bem longe de si, como coisa louca e sumamente absurda, como conto da carochinha e história de criança. Quando mostra alguma receptividade por essa semente, muitas vezes o diabo o instiga a proceder de outro modo.
Por isso, o Evangelho será sempre um caminho estreito (Mateus 7:13-14), não devido aos desígnios de Deus, mas aos nossos.
Mas para aqueles que recebem o Evangelho e, devido ao poder desse Evangelho, passam a crer, a fé se encarrega do resto. Por isso, S. Paulo afirma que os crentes não estão debaixo da Lei (Romanos 6:14; Gálatas 3:24-25). A fé cumpre a Lei de maneira voluntária e alegre, através do amor (Gálatas 5:6). Qualquer deficiência que houver no crente ao cumprir a Lei não é imputada como pecado, devido à fé. É por isso que o cristão verdadeiro é livre. Ele é capaz de viver a Lei sem se lembrar que ela existe. Não deseja nada dela, nem a teme. Ele não está preocupado com suas recompensas, nem com suas ameaças. Esta é a suficiência da fé produzida pelo Evangelho: que consideremos a Lei como alguém de casa, que amamos e respeitamos. 
Aqui é preciso destacar a diferença entre a Lei natural e a Lei dada a Moisés. A Lei natural é a que vale para nós, que cremos (Jeremias 31:33). A Lei de Moisés foi dada aos israelitas e dela estamos desobrigados (Gálatas 3:24-25). 
Então é necessário que se pergunte: Por que ainda mantemos a Lei de Moisés em nossas casas e cultos, se temos a Lei natural?
A relevância de Moisés para nós, que cremos, está no fato de ainda sermos carnais. A nossa carne tende a subestimar a Lei natural, tanto em seu conteúdo, como nas consequências de sua transgressão. Por isso, Moisés é de fundamental importância, porque ele nos apresenta a Lei natural de maneira visível, objetiva e com o acréscimo das ameaças, para que nossa carne não considere nenhum pecado desprezível. Também Moisés não esteve sujeito a erro ao escrevê-la, pois a recebeu do próprio Deus. Então a Lei de Moisés tem o selo de garantia do próprio Deus. Portanto, Moisés deve ficar conosco e devemos ouvi-lo, à medida em que sua Lei se coaduna com a Lei natural, para que nos ajude a mortificar nossa carne. A Lei de Moisés também nos ensina as verdadeiras obras, por meio das quais podemos exercitar nossa fé e servir ao nosso próximo. Sabemos que a carne gosta de inventar boas obras. Por isso, enquanto fé e carne conviverem sob o mesmo teto, a Lei de Moisés nos ajudará a destruir a carne, abrindo espaço à fé.
Quando, porém, formos inteiramente espirituais, ou seja, após a ressurreição dos mortos, não mais precisaremos de Moisés e seremos como Adão e Eva antes de sua queda em pecado, quando cumpriam de maneira perfeita a Lei natural e nela se compraziam.
Por ter ensinado isso, Dr. Martinho Lutero é acusado frequentemente de antinomismo. O que é isso? É ensinar a não necessidade da Lei de Moisés para os que creem no Evangelho. Não, ele não só era contra o antinomismo, como ele ainda nos ensinou a todos os dias recitar ou cantar os Dez Mandamentos, como lembretes ao perigo que a carne nos oferece constantemente e para que nos motivem a buscar o Evangelho e a praticar as verdadeiras obras. Na verdade, Dr. Martinho Lutero se posicionou contra a ênfase que a razão humana dá à Lei, principalmente à Lei de Moisés, em detrimento do Evangelho, mesmo entre os melhores cristãos. Lembremo-nos que a Lei serve ao Evangelho. É Moisés que serve a Jesus, não o contrário. A Lei é uma cooperadora do Evangelho e de acordo com seu ofício é que deve ser honrada entre nós.
Em suma, Lei e Evangelho são opostos entre si, mas são bons amigos. Não podemos abraçar o Evangelho e desprezar a Lei, muito menos o contrário. Precisamos de ambos, até que Cristo seja tudo em todos, até que o Evangelho nos absorva por completo. Se você está cansado e sobrecarregado pela Lei, busque o Evangelho, mas o Evangelho puro! Se você crê no Evangelho e o tem, não despreze Moisés como inimigo. Ele será seu amigo enquanto houver em você alguma carne que ainda necessite de morte.  
Sobre a historicidade da Lei e do Evangelho, recomendo a leitura do texto "De volta ao lar".

"Por isso, toma cuidado para não transformares Cristo num Moisés, nem fazeres do Evangelho uma lei ou cartilha (...). Pois o Evangelho, na verdade, não exige nossa obra para com ela ficarmos probos e salvos; na verdade, ele condena tal obra, exigindo, sim, a fé em Cristo, em que ele por nós superou o pecado, a morte e o inferno e nos vivifica, beatifica e nos torna probos, portanto, não por meio da nossa obra, mas por sua própria boa obra, morte e sofrimento, para que aceitemos sua morte e vitória como se nós mesmos o tivéssemos realizado" (Prefácio ao Novo Testamento, Dr. Martinho Lutero, 1545).




Autoria: Carlos Alberto Leão.
Imagem extraída da internet.

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