quarta-feira, 12 de agosto de 2015

MOISÉS E JESUS - PARTE 1



"Porque Deus amou ao mundo de tal maneira, que deu o seu Filho unigênito, para que todo o que nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna" (João 3:16).

Eu não sei se existe um evangélico convicto que não saiba esse versículo de cor. Afinal, ele é ensinado às nossas crianças desde cedo e há muito tem sido o nosso emblema. Com poucas palavras, ele informa o modo pelo qual Deus salva o homem: através do sacrifício de Cristo e através da fé. Deus provê tudo o que é necessário à nossa salvação, não exigindo nada de nós, exceto a fé. 
Com muita alegria afirmamos que somos evangélicos, porque temos conosco o Evangelho e nele cremos. Mas você já parou para pensar no que é Evangelho? Porque existe a Lei, igualmente dada por Deus, e frequentemente confundimos Lei com Evangelho. Por isso, é necessário que distingamos um do outro, para que não ocorra que sejamos encontrados "observando" o Evangelho.
É comum ver pessoas tomando todo o conteúdo dos evangelhos de S. Mateus, S. Marcos, S. Lucas e S. João como Evangelho, o que não é verdade, porque existe Lei nesses livros. Aliás, em proporções diferentes, praticamente todos os livros da Bíblia contêm Lei e Evangelho. 
Percebo essa confusão principalmente nos hinos que são cantados por nós, evangélicos. Por exemplo: 

A nova do Evangelho vem a todos avisar / do perigo grande e grave para quem se descuidar. / Salvai-vos desde já, não vos detenhais no mal; / não volteis atrás os olhos, pois vos pode ser fatal

É o Evangelho que nos acusa do pecado e nos ameaça? 

Outro cântico tradicional:  

Em Jesus confiar, / sua lei observar. / Oh! que bênção, que gozo, que paz! / Satisfeitos guardar tudo quanto ordenar / alegria perene nos traz. / Crer e observar tudo quanto ordenar; / o fiel obedece ao que Cristo mandar

Por esse hino entendo que Jesus é um legislador, tal como o foi Moisés.
Portanto, é muito comum que se confunda Lei e Evangelho. Entretanto, devemos tomar muito cuidado para manter a Lei e o Evangelho bem distintos um do outro para que não sejamos enredados pela justiça das obras e para que nossas consciências encontrem socorro seguro e descanso, sempre que pecarmos.
Pois bem, Lei e Evangelho são duas coisas absolutamente distintas, com propósitos contrários, mas que atuam de maneira muito harmônica e coordenada na salvação do homem. 
Quer coisas mais contrárias do que vida e morte? No entanto, uma é fundamental à outra. A vida no mundo é mantida pela morte. É por isso que todas as culturas e religiões aprenderam a reverenciar a morte como algo sagrado, necessário e muito salutar.
A morte e vida que percebemos no mundo natural, também podemos enxergar no universo de nossos sentimentos, em nossas estruturas sociais e políticas, e na espiritualidade.
A Lei foi entregue por Deus a todos os homens, indistintamente. Não há ser humano que não tenha a Lei de Deus inscrita em seu coração (Romanos 2:14-15). Deus a entregou de maneira especial ao povo de Israel, ou seja, visivelmente e sob a forma de aliança, por intermédio de Moisés. Entretanto, ela já existia no coração de todos os povos, razão pela qual é chamada de Lei natural. Com isso, Deus resguarda a norma de moralidade à qual todos, sem exceção, devem se sujeitar.
Após a queda de Adão e Eva, no contexto do pecado, a Lei permanece não para salvar, mas para refrear o pecado e para acusar o homem de sua pecaminosidade, com o intuito de trazê-lo de volta a Deus. 
Ninguém é salvo por meio da Lei. Quem se dedica a ela com esmero, como fazem os judeus, muçulmanos, budistas, espíritas e mesmo cristãos pouco instruídos, obterão respeitabilidade, honra e serão bem-sucedidos nesta vida ou temporalmente. Deus, porém, não nos vê como inocentes diante da norma de sua Lei, porque essa Lei não quer somente obras exteriores, mas exige o coração e a alma. Assim disse Moisés: "Amarás, pois, o SENHOR, teu Deus, DE TODO O TEU CORAÇÃO, DE TODA A TUA ALMA E DE TODA A TUA FORÇA" (Deuteronômio 6:5).
Ora, todos nós transgredimos a Lei a valer e nossas melhores obras não vêm inteiramente de nosso coração e alma. Como afirmou Santo Agostinho, nossa vontade nunca é completa para o bem. Há desejos perversos ocultos em nossas boas obras, que nem sempre somos capazes de discernir. Nosso coração é profundamente pecaminoso e não temos domínio sobre ele. Podemos impedir nossos membros de pecar, mas não temos poder sobre nossa mente. É como declara o profeta Jeremias: "Depravado e inescrutável é o coração do ser humano; quem o conhecerá?" (Jeremias 17:9).
Ao nos ordenar o que não podemos cumprir, a Lei nos mostra quem de fato nós somos, quão débil é nossa força para o bem e o quão vigorosa ela é para o mal. 
O pior é que a Lei ameaça com morte e inferno quem não a cumpre de maneira perfeita, ou seja, de coração e em sua totalidade. "Mas, se me não ouvirdes e não cumprirdes TODOS ESTES MANDAMENTOS; se rejeitardes os meus estatutos, e a VOSSA ALMA se aborrecer dos meus juízos, a ponto de não cumprir TODOS os meus mandamentos, e violardes a minha aliança, então eu vos farei isto: porei sobre vós terror, a tísica e a febre ardente, que fazem desaparecer o lustre dos olhos e definha a vida; e semeareis debalde a vossa semente, porque os vossos inimigos a comerão. Voltar-me-ei contra vós outros, e sereis feridos diante de vossos inimigos; os que vos aborrecerem assenhorear-se-ão de vós e fugireis, sem ninguém vos perseguir" (Levítico 26:14-17). Assim declarou S. Paulo a respeito: "O salário do pecado é a morte" (Romanos 6:23) e S. Tiago: "o pecado, uma vez consumado, gera a morte" (Tiago 1:15).
É por isso que o resultado coerente da análise da Lei é o pavor. Quem se propõe a perpassar sua vida pela Lei e a buscar nela a salvação, desde que o faça honestamente, encontrará a morte e nada mais. A Lei nos mostra "o que devemos fazer", mas não está preocupada com o "como fazer". Para ela pouco importa se somos aptos ou inaptos a cumpri-la. Lembremo-nos que ela foi concedida ao homem quando ele era perfeito e apto a cumpri-la. O homem caiu em pecado, mas a Lei permaneceu de pé, incólume.
Portanto, a Lei, quando bem compreendida, conduz o homem ao terror de consciência e ao medo de Deus. Em outras palavras, a Lei conduz à morte, como expressão da ira de Deus contra o pecado que ela evidencia. É claro que pouquíssimas pessoas chegam a essa percepção da Lei. A maioria faz o que pode e contenta-se com uma análise bem superficial dela, atendo-se a obras exteriores. Alguns poucos, porém, chegam a uma percepção mais profunda da Lei e de seu pecado e então sentem-se condenados. Por isso, S. Paulo chama a Lei de "ministério da morte" (2 Coríntios 3:7). A Lei é morte não em sua essência, mas porque somos morte e ela é um espelho que nos revela isso.
Quando a Lei cumpre o seu propósito e o homem se sente abatido e prostrado pela consciência de seu pecado e perdição, é então que o Evangelho deve entrar em cena.



Autoria: Carlos Alberto Leão.
Imagem extraída da internet.

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