sexta-feira, 22 de maio de 2015

DEUS - PARTE 2


A Igreja cristã, como cisão do judaísmo, começou a difundir a nova fé de que Jesus Cristo é Deus, igual ao Pai. Jesus havia ensinado: "Eu e o Pai somos um" (João 10:30). "Quem me vê a mim vê o Pai" (João 14:9). "Eu sou a ressurreição e a vida. Quem crê em mim, ainda que morra, viverá" (João 11:25). "E, agora, glorifica-me, ó Pai, contigo mesmo, com a glória que eu tive junto de ti, antes que houvesse mundo" (João 17:5). "Eu sou o caminho, e a verdade, e a vida" (João 14:6). "Não se turbe o vosso coração; credes em Deus, CREDE também em mim" (João 14:1). "Mas ele lhes disse: Meu Pai trabalha até agora, e eu trabalho também. Por isso, pois, os judeus ainda mais procuravam matá-lo, porque não somente violava o sábado, mas também dizia que Deus era seu próprio Pai, fazendo-se igual a Deus" (João 5:17-18). "Porque assim como o Pai tem vida em si mesmo, também concedeu ao Filho ter vida em si mesmo" (João 5:26). "E tudo quanto pedirdes em meu nome, ISSO FAREI, a fim de que o Pai seja glorificado no Filho (João 14:13). São João foi o evangelista mais destemido, ao citar as diversas vezes em que Jesus Cristo se apresentou como sendo igual ao Pai, ou seja: a Deus. 
No início, ainda havia muitos judeus que criam em Jesus Cristo como sendo o Messias, não Deus. No entanto, conforme os apóstolos começaram a ensinar a divindade de Jesus Cristo, eles foram deixando a Igreja, escandalizados, de maneira que esta passou a ser constituída basicamente de gentios.
Além de revelar a divindade de Jesus Cristo, Deus revelou à Igreja cristã um "terceiro Deus", a saber: o Espírito Santo. Ele é citado diversas vezes no Antigo Testamento, mas até Pentecostes, quando ele foi derramado sobre os crentes em Jesus Cristo, não era conhecido como um ser pessoal. São Lucas cita crentes em Cristo que nada tinham ouvido falar acerca do Espírito Santo como pessoa (Atos 19:1-2).
Jesus Cristo ensinou que o Espírito Santo é um ser pessoal, que ensina, convence e consola: "Mas o Consolador, o Espírito Santo, a quem o Pai enviará em meu nome, esse vos ensinará todas as coisas e vos fará lembrar de tudo o que vos tenho dito" (João 14:26). "Mas eu vos digo a verdade: convém-vos que eu vá, porque, se eu não for, o Consolador não virá para vós outros; se, porém, eu for, eu vo-lo enviarei. Quando ele vier, convencerá o mundo do pecado, da justiça e do juízo" (João 16:7-8). Também ensinou que pecar contra o Espírito Santo era diferente de pecar contra ele e contra o Pai (Marcos 3:28-29).
No batismo de Jesus Cristo, o Espírito Santo veio ao mundo na forma de pomba, dissociado do Pai (Mateus 3:16-17). No dia de Pentecostes, assumiu a forma de línguas de fogo (Atos 2:3). 
Os apóstolos e S. Lucas continuaram ensinando a personalidade do Espírito Santo. Por exemplo: "Pois pareceu bem ao Espírito Santo e a nós não vos impor maior encargo além destas coisas essenciais" (Atos 15:28). "Defrontando Mísia, tentavam ir para Bitínia, mas o Espírito de Jesus não o permitiu" (Atos 16:7). "Também o Espírito, semelhantemente, nos assiste em nossas fraquezas; porque não sabemos orar como convém, mas o mesmo Espírito intercede por nós sobremaneira, com gemidos inexprimíveis" e ainda: "e aquele que sonda os corações sabe qual é a mente do Espírito, porque segundo a vontade de Deus é que ele intercede pelos santos" (Romanos 8:26-27). "O Espírito a todas as coisas perscruta, até mesmo as profundezas de Deus" (1 Coríntios 2:10). "Não entristeçais o Espírito de Deus, no qual fostes selados para o dia da redenção" (Efésios 4:30).
Somente um ser pessoal pode ter opinião, não permitir, ajudar, interceder, gemer, pensar de acordo com a vontade de Deus, perscrutar e entristecer-se. 
Esse meu esforço em demonstrar a personalidade do Espírito Santo parte da seguinte ideia: para o povo de Israel (e para a Igreja cristã primitiva) não havia dúvidas que o Espírito Santo, citado inúmeras vezes no Antigo Testamento, era Deus. Entretanto, ninguém o imaginava como sendo uma pessoa. A grande surpresa para a Igreja cristã foi a revelação do Espírito Santo como ser pessoal.
Mas vamos lá! A Bíblia prova que o Espírito Santo é Deus? É claro que sim. Como disse, nunca isso foi questionado pelo povo de Israel e pelos primeiros cristãos. Acho muito cansativo apanhar os atributos de Deus e buscar textos bíblicos que atribuem ao Espírito Santo cada um desses atributos. Fica valendo o seguinte silogismo: Deus não é criatura e criatura não é Deus. Não é possível ser Deus e criatura ao mesmo tempo. Logo, o que não for criatura completa é Deus completo.
São Paulo nos ensinou: "Nem olhos viram, nem ouvidos ouviram, nem jamais penetrou em coração humano o que Deus tem preparado para aqueles que o amam. Mas Deus no-lo revelou pelo Espírito; porque o Espírito A TODAS AS COISAS PERSCRUTA, ATÉ MESMO AS PROFUNDEZAS DE DEUS. Porventura qual dos homens sabe as coisas do homem, senão o seu próprio espírito, que está nele? Assim, também as coisas de Deus, ninguém as conhece, senão o Espírito de Deus" (1 Coríntios 2:10).
Deus é incognoscível, apreendido somente pelo espírito humano, através da fé, não da razão. O que dele sabemos é o que foi revelado por ele. Deus não nos revelou quem ele é para que o conheçamos. Ele revelou o suficiente para que possamos amá-lo, crer nele e para que sejamos salvos.
Deus é inefável, incompreensível e habita em "luz inacessível". Somente ele pode conhecer inteiramente a si mesmo. Em outras palavras, a onisciência de Deus lhe permite conhecer a si mesmo. São Paulo destacou que o Espírito de Deus a tudo conhece, inclusive o próprio Deus. Aqui está provada a onisciência do Espírito Santo, que não pode ser atribuída a nenhuma criatura. Se o Espírito Santo é onisciente, ele é necessariamente Deus. Sendo Deus, não o é em parte, mas Deus completo. 
São Paulo faz uma analogia belíssima e muito ousada. Compara a relação entre Espírito Santo e Deus com a relação entre nosso espírito e corpo. Assim como somente a alma humana compreende o homem, somente o Espírito Santo compreende Deus. Mas veja a beleza da analogia: a unidade entre Deus e Espírito Santo é comparada por S. Paulo à unidade entre corpo e alma.
O dilema então era o seguinte: Deus é um só, não obstante seja Deus, Jesus Cristo e Espírito Santo. Em momento algum os cristãos primitivos conceberam a ideia de três Deuses. Continuaram firmes na convicção de que havia somente um Deus, aquele mesmo que havia iniciado sua revelação a Abrão, no Antigo Testamento. São Paulo ensinou: "Há somente um corpo e um Espírito, como também fostes chamados numa só esperança da vossa vocação; há um só Senhor, uma só fé, um só batismo, um só Deus e Pai de todos, o qual é sobre todos, age por meio de todos e está em todos" (Efésios 4:6). Também: "Para nós há um só Deus, o Pai, de quem são todas as coisas e para quem existimos" (1 Coríntios 8:6a). Entretanto, passaram a confessar que esse único Deus é Pai, Filho e Espírito Santo.
Fé é coisa simples. Não há necessidade de ser explicada. A fé agarra o que lhe é revelado e não busca uma explicação ou harmonizações. Quem nos obriga a explicar e harmonizar, com a assistência do Espírito Santo, são os hereges, ou seja, o próprio diabo. 
Por muitos anos, a Igreja cristã creu e confessou que o único Deus de Israel é Pai, Filho e Espírito Santo. Não conhecia o termo "trindade", nem os termos "substância" e "consubstancialidade". De nada disso a fé necessitava para aceitar a revelação de Deus.
Quero deixar claro que, embora o termo "trindade" não conste das Escrituras, até porque não houve essa demanda durante a era apostólica, o artigo de fé nomeado por ela foi ensinado pelo próprio Jesus: "Ide, portanto, fazei discípulos de todas as nações, batizando-os em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo" (Mateus 28:19). 
Está claro que Jesus Cristo ordenou que se batizasse em nome de Deus, mas não ordenou que se batizasse em nome do "Pai" ou em "meu nome", como costumava falar, toda vez que se dirigia à divindade. Aqui ele distingue as três pessoas da divindade. 
Nesse ensinamento a Igreja primitiva se firmou, sem explicar, de maneira muito singela, até que surgiu Ário (256-335 DC). 
Nunca uma heresia ameaçou tanto a existência da Igreja como o arianismo. Ário ensinava, de maneira muito palatável à razão, aquilo que os judeus-cristãos criam: Que Deus é um só, que Jesus Cristo é criatura e que o Espírito Santo não é um ser pessoal. Ardiloso como sempre, o diabo usou Ário para ensinar que a designação de "Deus" poderia ser atribuída à pessoa de Jesus Cristo, embora este não fosse Deus em sua essência. Se perguntassem a Ário: "Você crê que Jesus Cristo é Deus?", ele responderia que sim. "Você crê que o Pai e Jesus Cristo são um?", ele igualmente afirmaria que sim, muito embora ensinasse que Jesus Cristo não era Deus de fato, mas criatura.
Essa heresia ganhou muitos adeptos, espalhando-se rapidamente pelo Império Romano, colocando em ameaça o cristianismo autêntico. Até mesmo o filho do Imperador Constantino, Constâncio, foi seduzido pelos arianos e passou a perseguir os bispos cristãos que permaneceram na ortodoxia apostólica, como, por exemplo, Santo Atanásio, bispo de Alexandria. 
Quando o diabo apareceu com essa heresia, a fé simples da Igreja cristã na existência de três pessoas na divindade teve que ser explicada, caso contrário os arianos venceriam e a fé cristã seria destruída. Mas como explicar uma doutrina como essa?
Fico admirado com a Providência Divina, que faz com que tudo aconteça no tempo certo e no lugar certo. Quem me lê, sabe que tenho muitas reservas quanto ao uso da razão na teologia. O que Deus ensina não deve ser entendido, somente crido. Mas quando a heresia vem, a razão e a linguagem têm que auxiliar a fé, para que se possa definir e deixar tudo muito claro; obviamente, com o auxílio do Espírito Santo. Foi assim que a doutrina cristã sobre Deus teria perecido, não fosse o auxílio da língua grega, da língua latina e da filosofia grega. As línguas e a filosofia não criaram a doutrina de Deus, mas permitiram a sua defesa, através de definições muito claras. Mais um motivo para Deus se revelar em Jesus Cristo nos tempos do Império Romano e não antes. A Igreja haveria de precisar das línguas grega e latina, bem como de termos e conceitos da filosofia grega, para defender a revelação de Deus.
Graças ao latim, ao grego e à filosofia, a Igreja cristã pôde defender sua fé, no Concílio de Niceia e mesmo depois, porque a heresia ariana persistiu por muito tempo, influenciou o pensamento de Maomé, recidivou várias vezes dentro da cristandade e até hoje está bem presente entre nós. Os debates de Niceia permitiram a estruturação da doutrina cristã de Deus sob o credo niceno, com grande detalhamento.
É bom destacar que o diabo, ao investir contra a Igreja, deu um tiro no pé, porque a heresia ariana forçou a Igreja cristã a nomear, conceituar e explicar a sua fé sobre Deus de maneira tão abrangente, detalhada e clara, que hoje é impossível alguém pegar o credo niceno e lhe dar uma interpretação indevida no que tange à doutrina da Santíssima Trindade. Sobre Deus, pode-se pensar o que quiser, mas não com o respaldo desse credo.
Sinceramente, eu não sei quando o diabo irá levar mais a sério estas palavras de Jesus: "Também eu te digo que tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei a minha igreja, e as portas do inferno não prevalecerão contra ela" (Mateus 16:18). 
Não quis me ocupar aqui com o Concílio de Constantinopla, porque ele foi simplesmente a conclusão do Concílio de Niceia.


Autoria: Carlos Alberto Leão.
Imagem extraída da internet.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.