São os
mistérios que me tornam cristão, não as evidências, nem a lógica. Para conhecer
o verdadeiro Deus é necessário tão somente ser tocado pela fé, que é a única
maneira de apreender seus mistérios.
A vida
cristã começa na interioridade, onde Deus nos toca com a fé. A partir daí,
seguimo-lo, mesmo sem entender, dispensando explicações.
É da
experiência pessoal com Deus que nasce o cristão. É do toque de Deus! não de
livros, nem de debates ou academia. Ninguém aprende a ser cristão. Ninguém
convence o outro a se tornar cristão. Somente o toque de Deus e nada mais.
Não quero,
com isso, desprezar a teologia. É importantíssimo que lancemos mão da razão e
da linguagem para podermos defender a verdade frente às heresias que pululam no
mundo o tempo inteiro. Mas a teologia deve reconhecer seus limites. Não é uma
ciência como as outras, que busca explicar tudo com base no que já se sabe.
Não, seu papel é muito mais restrito. É função da teologia rebater o que é errado
e defender o que é certo. Para isso, é óbvio que necessita da razão, porém não
com o intuito de explicar o que se deve crer, mas de definir,
classificar, rechaçar e aceitar.
Teologia não
é o conhecimento ou ciência de Deus. Deus é insondável e incognoscível a
qualquer mente. "Nem olhos viram, nem ouvidos ouviram, nem jamais
penetrou em coração humano o que Deus tem preparado para aqueles que o amam.
Mas Deus no-lo revelou pelo Espírito; porque o Espírito a todas as coisas
perscruta, até mesmo as profundezas de Deus" (1 Coríntios 2:9-10). O
conhecimento de Deus pleno só é possível a Deus. Ninguém o conhece plenamente,
senão ele próprio. Nesses versículos temos inclusive uma das provas da
divindade do Espírito Santo. Portanto, Deus Pai se revela através de suas
obras, através de seu Filho, que é Deus, e através de seu Espírito Santo, que
também é Deus. Essa revelação nos mostra um pouco do que ele é, para que o
amemos e para que sejamos salvos, não para que o compreendamos.
É muito
perigoso quando alguém se debruça sobre o que Deus nos revelou acerca de si
mesmo, como se estivesse diante de uma planta, animal ou algo inanimado, para
estudá-lo. Deus não deve ser alvo de especulações. É por isso que temo muito
quando deixamos de interpretar a Bíblia de maneira literal e bem
contextualizada e começamos a transformar textos amargos em textos doces,
através de nossa razão. Tudo o que há de amargo na Bíblia, é para a nossa razão
que é amargo, não para a fé. O que é palatável à razão, não o é para a fé.
Portanto, sejamos muito cautelosos. Que a fé prevaleça! Em última análise, Deus
será sempre saboroso ao nosso espírito e amargo à nossa carne.
"Disto
também falamos, não em palavras ensinadas pela sabedoria humana, mas ensinando
pelo Espírito, conferindo coisas espirituais com espirituais" (1
Coríntios 2:13). Aqui S. Paulo nos exorta a nunca conferir coisas espirituais
com a ciência humana, mas com coisas espirituais. Que é isso senão crer? Não
analiso os mistérios com base no que sei, mas analiso o que sei com base nos
mistérios. É assim que o crente dá lições ao descrente, mesmo quando é
iletrado. Até hoje debatemos o que é vida. Que cristão, porém, tem dúvidas do
que é vida? Ele pode não explicar, mas sabe muito bem. É assim que uma cristã
se recusa a praticar o aborto, porque sabe que estará provocando uma morte,
mesmo sem saber quando a vida começa ou termina. Ela vê a vida como coisa que
ela conhece e não conhece, ao mesmo tempo, porque analisa o que sabe dentro do
contexto do mistério. Assim poderia dizer: "Eu não sei exatamente o que é
vida, mas sei que o que está dentro de meu ventre é vida".
Os mistérios
não têm explicação, mas somente explicamos algo quando nos rendemos a eles.
Quantos mistérios têm que ser aceitos, para se chegar a uma única teoria? Se
alguém não fizer concessão aos mistérios, não chegará a verdade alguma.
Portanto, a
aceitação dos mistérios amplia nossa compreensão da realidade, porque tudo o
que é compreensível está permeado pelo incompreensível.
São Paulo
diz: "O homem espiritual julga todas as coisas, mas ele mesmo não é
julgado por ninguém" (1 Coríntios 2:15). De fato, mais sabe sobre o
universo um homem caipira que olha para o céu e vê nele seu criador que muitos
físicos renomados, que olham para o mesmo céu e só enxergam a evidente cortina
da matéria.
Voltando ao
começo, quero deixar claro que amo teologia e considero dever de todo cristão
culto dedicar tempo a ela. Mas entenda que explicações precisam da aceitação de
mistérios. Uma boa teologia se baseia na aceitação passiva de verdades
reveladas, sem a pretensão de harmonizá-las.
Devo
confessar que trilhei um caminho de 11 anos para chegar a essa conclusão.
"Pelo viver, mais ainda, pelo morrer e ser condenado faz-se um teólogo, não pelo compreender, ler ou especular" (Dr. Martinho Lutero).
Autoria: Carlos Alberto Leão.
Imagem extraída da internet.
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