quinta-feira, 16 de julho de 2015

O DESAMPARO DA INDIVIDUALIDADE


Quisera eu não ser eu, quisera eu não ser outro. Quisera eu não sentir que existo. Quisera eu ser um mero expectador de não sei o quê.
Ser adulto não é fácil. Sou oprimido pelas minhas expectativas, sou oprimido por expectativas alheias reais, supostas ou deliradas; não sei dizer. Só posso afirmar que para mim são reais. Gostaria de me livrar dessa adultice de uma vez por todas. Gostaria de não sentir meu corpo, de não sentir seus desconfortos, de não suar, de não defecar, de não urinar, de não comer, de não respirar, de não precisar o tempo inteiro. Esse meu corpo parece uma roupa apertada. Minha alma tímida e desconfiada é tão pesada quanto aço. Gostaria de saber quem incomoda mais quem: se meu corpo incomoda minha alma ou se minha alma incomoda meu corpo. São dois desconfortos. Gostaria de saber quem dos dois se sente mais sobrecarregado. Mas se souber, o que poderei fazer? Deixe pra lá! 
Há dias em que todas as flores são de plástico. A comida parece ser uma matadora de fome. A água parece ser uma matadora de sede. O ar parece ser um enchedor de pulmões. Nesses dias, eu sinto a minha respiração. Odeio senti-la! Nesses dias a vida parece tão artificial que me sinto um boneco. Há dias em que o meu mundo parece uma cela. Há dias em que sou um hamster na rodinha.
Mas o hamster não tem consciência de nada. Pelo menos é o que eu acho. Eu, porém, tenho uma maldita consciência de que sou um hamster na rodinha. Mas é pior que ser um hamster na rodinha, porque ele não tem outras tarefas senão comer, beber, dormir e girar a rodinha. Quanto a mim, eu vejo expectativa por todo lado. Girar a rodinha é pouco; tenho que ser um GRANDE girador de rodinhas.
Por que tenho que ser tão material, tão duro, tão visível, tão exposto, tão dolorido, tão sufocado, tão pensante? Mas não posso consentir em ser diferente do que sou, mesmo se tivesse poder para isso.
Cada um imagina o Céu de um jeito. Para mim o Céu é existir como se não existisse, é não se sentir, é não ter consciência da existência, é não ser. Acho que só assim me apeteceria a vida eterna. Vida que não esteja sozinha, partida, separada, cônscia de si. Não considero a consciência algo ruim. Para mim o tormento está na consciência de mim mesmo.
É nessas horas, quando sinto o fardo da adultice, do desamparo da individualidade e da existência, é que invejo os insanos como verdadeiro protótipo da bem-aventurança. Eles sim parecem existir como se não existissem.



Autoria: Carlos Alberto Leão.
Imagem extraída da internet.


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