sábado, 14 de maio de 2016

A MEMÓRIA

Por que você ora a Deus? Por que chama a Cristo de Senhor? Quem lhe diz que na Eucaristia há mais do que pão e vinho? Quem lhe ensina que o Batismo não é mera água? De onde vem o ímpeto para lutar contra o pecado? Aliás, quem lhe informa que seus erros são mais do que erros, são pecados? Certamente não é o intelecto. Quando S. Pedro confessou Jesus como Messias, Filho do Deus vivo, ouviu dele o seguinte: "Bem-aventurado és, Simão Barjonas, porque não foi carne e sangue que to revelaram, mas meu Pai que está nos céus" (S. Mateus 16:17).
Deus é abscôndito e não pode ser apreendido pela razão natural. Por mais arguta que seja a mente humana, nada poderá saber dele além daquilo que ele lhe permite saber. Nosso intelecto sabe que somos revelação de Deus, bem como todas as suas criaturas, mas isso não é suficiente. As montanhas e mares me revelam um Deus grandioso, a história me revela um Deus soberano, as catástrofes naturais me revelam um Deus justo, meu pecado me revela um Deus santo; alimento, ar, água, semeadura, colheita, luas e estações me revelam um Deus bondoso e providente. Mas nada disso me revela um Deus que me ama, que me quer, que me vê, que me ouve, que se atenta às minhas lágrimas, que me vê como filho, que se compadece de mim, que me socorre em meu profundo anonimato. Isso a criação não me revela. A criação me revela Deus, porém não o meu Deus, muito menos o meu Pai.
Então Deus se revela ao homem desde a criação como seu Deus e Pai através de sua Palavra, de seu Anjo, de antropomorfismos, de seu tabernáculo, de seus reis, profetas e sacerdotes. Deus se deu a conhecer ao homem como seu Deus e Pai através de seu único Filho, Jesus Cristo, que é a Palavra, o Anjo, o antropomorfismo, o tabernáculo, o Rei, Profeta e Sacerdote. Jesus é a revelação do amor paternal de Deus por todos os homens, é seu olhar compassivo para os pobres, é seu pesar e choro diante da tragédia humana, coletiva e individual. Jesus é a revelação do amor pessoal de Deus por cada pessoa. Através de Jesus, descubro que Deus me ama até à morte. Através de Jesus, descubro em Deus o meu Deus. O homem Jesus é o acesso seguro ao meu Deus e Pai. Se permaneço com meus olhos fitos no homem Jesus, estou vendo o meu Deus. 
Entretanto, quem foi capaz de encontrar em Jesus seu verdadeiro Deus? Anjo e antropomorfismos podiam ser lendas do povo judeu. O tabernáculo era uma simples tenda consagrada a Deus. Reis, profetas e sacerdotes eram homens. Jesus também era um homem; na melhor das hipóteses, um profeta. Hoje é um personagem histórico controverso. Quem pode enxergar em Jesus o seu Deus?
É então que chegamos ao Deus Espírito Santo. São Paulo nos ensina: "Por isso, vos faço compreender que ninguém que fala pelo Espírito de Deus afirma: Anátema, Jesus! Por outro lado, ninguém pode dizer: Senhor Jesus!, senão pelo Espírito Santo" (1 Coríntios 12:3). 


Deus Espírito Santo é quem nos revela Deus através do homem Jesus. No Antigo Testamento, o povo judeu era conduzido pelo Espírito Santo ao conhecimento do amor paternal de Deus através da Palavra, do Anjo, dos antropomorfismos, do tabernáculo, dos reis, profetas e sacerdotes de Israel, que eram o próprio Jesus. No Novo Testamento, é ele quem nos conduz ao conhecimento do amor paternal de Deus através do homem Jesus. O Espírito Santo sempre gerou fé no coração humano, para depois descortinar diante dela o homem Jesus, única revelação do amor paternal de Deus. 
É o Espírito Santo quem nos dá a conhecer o homem Jesus, que, por sua vez, revela o sentimento de Deus pelo homem. Em outras palavras, o Espírito Santo revela o homem Jesus, que revela Deus. 
O Espírito Santo é Deus abscôndito. Não sabemos quem ele é, nem jamais tomaríamos conhecimento de sua existência, não fosse a Palavra de Deus, que é Jesus. O próprio Espírito Santo, sendo Deus, revela-se através de Jesus. Então Deus Espírito Santo se revela ao revelar Jesus. Ele é conhecido por nós à medida em que nos dá a conhecer Jesus.
Muitos buscam uma experiência com o Espírito Santo à parte de Jesus, como se isso fosse possível. Toda experiência com o Espírito Santo é necessariamente uma experiência com o Deus encarnado, Jesus Cristo. 
De tal maneira a manifestação do Espírito Santo está ligada à revelação de Jesus que ele, não sendo Filho de Deus, clama "Aba, Pai" (Gálatas 4:6). Também é chamado de Advogado (S. João 14:16) e de Intercessor (Romanos 8:26-27). Ora, não é Jesus o Advogado e Intercessor da Igreja? Sim, mas o Espírito Santo revela o Filho, o Advogado e Intercessor não como um homem faria, mas essencialmente, encarnando-o na Igreja (S. João 14:23; 17:20-23). Por causa do Espírito Santo, a Igreja é o corpo de Cristo. A função do Espírito Santo na economia divina é tornar Jesus realidade concreta ao seu povo, tanto no âmbito coletivo, quanto no pessoal. Foi por isso que Jesus disse, a respeito dele: "Ele me glorificará, porque há de receber do que é meu e vo-lo há de anunciar" (S. João 16:14).
O Espírito Santo nos mortifica ao nos revelar a morte de Jesus. Ele nos regenera ao nos fazer lembrar a ressurreição de Jesus. Opera em nós toda a sorte de boas obras ao nos fazer lembrar as obras de Jesus. Ele nos ensina quem é Jesus ao fazer Jesus habitar em nós. 
Ao mesmo tempo, o Espírito Santo se manifesta ao manifestar Jesus. Daí as palavras de S. Paulo: "Ninguém pode dizer: Senhor Jesus!, senão pelo Espírito Santo". Reconhecemos a presença do Espírito Santo quando experimentamos o homem Jesus. Sabemos que ele está em nós quando sentimos Jesus em nós. Sabemos que ele frutifica em nós quando identificamos em nós as mesmas obras de Jesus.
O Espírito Santo é a memória da Igreja. Como disse Jesus a seu respeito: "Mas o Consolador, o Espírito Santo, a quem o Pai enviará em meu nome, esse vos ensinará todas as coisas e vos fará lembrar de tudo o que vos tenho dito" (S. João 14:26). Ele nos faz lembrar de Jesus ao torná-lo muito presente entre nós, fazendo esvaecerem tempo e espaço. Ele mantém Cristo entre nós, não nos deixando órfãos. Se temos conosco o Espírito Santo, temos o homem Jesus. Igualmente, se temos conosco o homem Jesus, é certo que o Espírito Santo está conosco.
O Espírito Santo é quem falou pelos profetas, que deu habilidade aos artífices para construção do tabernáculo, que deu sabedoria aos reis e ungiu os sacerdotes do Antigo Testamento. Em tudo isso, o Espírito Santo estava erigindo Cristo no meio de Israel. Foi o Espírito Santo que milagrosamente operou a concepção de Jesus no ventre da virgem Maria, dando-nos o homem Jesus. Também conduziu a Jesus muitas pessoas contritas, para que pudessem experimentar a misericórdia de Deus. Pelo seu poder, Jesus ressuscitou dos mortos. Por fim, preserva Jesus no mundo através da Igreja, a quem transforma em corpo de Cristo. 
Algumas liturgias eucarísticas invocam o Espírito Santo para que transforme o pão e o vinho em corpo e sangue de Cristo. A isso chamamos de epiclese. Em que pese a polêmica sobre quando é que o pão se torna o corpo de Cristo e que o vinho se torna o sangue de Cristo, a epiclese nos ensina que sem o Espírito Santo não é possível que o homem Jesus esteja entre nós. 
Percebemos então que a obra própria do Espírito Santo é trazer Jesus ao homem, fazendo-o experimentar a paternidade de Deus, sua misericórdia e ternura. Nunca se deve dissociar o Espírito Santo do homem Jesus, pois ele próprio nada significa para nós se não nos trouxer Jesus. 
Pentecostes vem nos mostrar que o Espírito Santo não é derramado sobre um povo, mas sobre cada pessoa, fazendo-a experimentar Jesus pessoalmente. É assim que o Espírito Santo me revela que o Deus da criação é meu Deus e Pai, ama-me até à morte e tem o nome de Jesus.
Celebremos, nesta festa de Pentecostes, aquele que torna Jesus presente entre nós, para que experimentemos a boa vontade de Deus para conosco e para cada um de nós.

"Não rogo somente por estes, mas também por aqueles que vierem a crer em mim, por intermédio da sua palavra; a fim de que todos sejam um; e como és tu, ó Pai, em mim e eu em ti, também sejam eles em nós; para que o mundo creia que tu me enviaste. Eu lhes tenho transmitido a glória que me tens dado, para que sejam um, como nós o somos; eu neles, e tu em mim, a fim de que sejam aperfeiçoados na unidade, para que o mundo conheça que tu me enviaste e os amaste, como também amaste a mim" (S. João 17:20-23).

Autoria: Carlos Alberto Leão.
Imagem extraída da internet.


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