quarta-feira, 13 de janeiro de 2016

LEI DA LIBERDADE

"Para a liberdade foi que Cristo nos libertou. Permanecei, pois, firmes e não vos submetais, de novo, a jugo de escravidão" (Gálatas 5:1).



Um de meus filmes favoritos é A Vila, escrito e dirigido por Night Shyamalan. É um filme que vale a pena ser assistido. Recomendo muito!  
O filme trata da questão de se impor o medo com o intuito de preservar a inocência. Ninguém duvida que leis, regras e medo protejam. Mas até que ponto se deve proteger alguém em detrimento de sua liberdade? É sobre isso que o filme nos leva a refletir.
São Paulo trata aqui da liberdade cristã. Deus não nos chamou para a servidão, para o medo, para a sujeição a regras, mas para a liberdade de filhos.
O legalismo estabelece uma zona de conforto e proteção. É muito mais seguro estatuir regras que permitir a liberdade, principalmente porque a maioria das pessoas - penso eu - não possui maturidade suficiente para ser livre. 
Deus estabeleceu a Lei e a promulgou com o intuito de governar um povo que não era livre. A Lei dada a Moisés serviu a uma nação inteira, não somente a crentes. Ela foi dada a Moisés para que este legislasse crentes e descrentes, pessoas maduras e imaturas, gente honesta e bandidos, espírito e carne. Tudo isso havia na nação de Israel. Uma só Lei foi promulgada a todos.
Hoje a situação é outra: temos o direito secular, que consiste de muitas leis a que se deve obedecer, caso contrário haverá penalidades. Essas leis seculares são baseadas na Lei natural, que nos é inata, ou seja, vêm do senso comum de justiça. Há também leis espirituais, por meio das quais Deus governa sua Igreja.
As leis seculares servem para os cristãos e para os incrédulos. Ninguém aqui fala em maturidade, consciência, honestidade, voluntariedade ou amor. São leis escritas para pessoas honestas e para bandidos, que deverão ser cumpridas sem questionamento, com prazer ou desprazer.
As leis espirituais servem exclusivamente à Igreja, porque são cumpridas somente pela fé, que não existe fora da Igreja. Há somente duas leis espirituais: Amar a Deus e amar ao próximo. Esses dois mandamentos compreendem toda a Lei natural, dentro e fora do direito secular. 
Amar a Deus é crer de verdade. Amar ao próximo é cumprir todo o restante da Lei natural, conduzido pela fé.
Veja-se então que a situação muda, porque a fé cumpre a Lei de Deus de maneira espontânea, cheia de alegria e boa vontade, porque o ama. Ninguém pode ordenar nada à fé! Ordenamos muitas coisas à nossa carne, ao nosso velho homem, ao que existe de Adão em nós. Mas não é necessário dar ordem alguma à fé, porque ela faz tudo livremente, conduzida pelo amor a Deus. Por isso S. Tiago chama a Lei natural de "Lei da liberdade" (Tiago 1:25), não por desconsiderar suas imposições, mas porque a fé não a vê como Lei ou imposição, antes como coisa excelente e inevitável, tão natural quanto amar. Também S. João conclui que "os mandamentos não são penosos" (1 João 5:3). Ora, a Lei natural só não é penosa a quem é livre diante dela, opta por ela e deleita-se nela, o que é possível somente ao que crê. 
A fé é livre e liberta quem a possui. Ela está livre diante de todas as coisas: cultura, comida, vestuário, sexualidade, profissão, etc. Inicia a libertação em nosso interior, onde se encontram a razão natural, os apetites e sentimentos, avançando para o exterior, de maneira a atingir nossas obras e o entorno, santificando todas as coisas. Ninguém diz à fé: Faça isso ou aquilo! Você está proibida de fazer isso ou aquilo! Ela não precisa de regras ou conselhos, mas segue amando a Deus através de tudo e a tudo santificando através desse amor. Por isso, São Paulo declara que "todas as coisas são puras para os puros" (Tito 1:15), porque a fé torna tudo puro, a começar pelo seu portador e avançando para tudo aquilo que está ao seu redor ou ao seu dispor. É ela que santifica as tradições, as comidas, o matrimônio, os ofícios e os diferentes estados de vida que existem, porque tudo faz por amor a Deus, de maneira que não erra nunca! 
É essa obediência que provém da fé que Deus requer. Ele não quer mais nos governar exteriormente através de leis exteriores, como é o caso do Direito Canônico. Ele quer a obediência amorosa e grata que provém espontaneamente da fé, que age pelo amor e a tudo santifica, não havendo necessidade de ser instruída por ninguém, nem mesmo por Moisés.
Quando S. Paulo afirma que não estamos mais sob a Lei (Romanos 6:14), é para ressaltar a liberdade da fé no cumprimento da Lei. Ela cumpre a Lei mesmo sem se atentar a ela, naturalmente, alegremente, conduzida pelo amor a Deus.
É esta a verdadeira obediência, a que provém do amor, que é o fruto mais excelente da fé verdadeira. Quando amamos alguém, nós o obedecemos com alegria. Quando não amamos e somos obrigados a obedecer, limitamo-nos muito em nossa ação, fazendo ou não fazendo somente o que a letra determina e, mesmo assim, só procedemos corretamente quando estamos sob a vista de quem tem poder de nos punir. Isso definitivamente não é obediência, mas medo de punição. É por esse motivo que Deus não aceita obras que não sejam fruto da fé, porque não se pode dizer delas que sejam verdadeira obediência.
Se a fé nos regesse de maneira ilimitada, nenhuma lei exterior seria necessária. Poderíamos inclusive trancar num baú a Lei de Moisés. 
Mas não somos inteiramente regidos pela fé. Nós temos carne, Adão, velho homem ou concupiscência em nós, que luta contra a fé constantemente, sempre em rebeldia contra Deus. Ora a fé prevalece e cumprimos a Lei. Ora a carne prevalece e praticamos pecado mortal. Mesmo quando cumprimos a Lei, ainda há carne envolvida, dividindo nossa vontade, imiscuindo-se nela com sua vaidade e amor próprio, tornando esse cumprimento imperfeito. Daí vêm os pecados de fraqueza ou veniais, que Cristo prontamente perdoa, razão pela qual pouco nos importam.
Por causa de nossa carne, devemos permanecer em vigilância constante e não devemos desprezar Moisés. Deus corrige nossa carne através da Lei de Moisés, mais precisamente através da Lei natural que encontramos em Moisés. 
Nossa fé não precisa ser advertida pelo mandamento: "Não matarás", mas nossa carne sim! Igualmente não é necessário que se diga à fé: "Não cometerás adultério", mas nossa carne precisa ouvir isso e ser confrontada por essa lei vez ou outra. E assim vai. 
Onde estava a fé de Davi quando cometeu adultério com Bate-Seba e assassinou seu marido? Com certeza estava lutando contra a carne, como lhe é próprio, porém estava perdendo a batalha. A carne encontra muitos subterfúgios racionais que justifiquem seu modo de agir e é por demais escorregadia. Nem sempre a fé pode com ela. Então foi necessário que o profeta Natã lhe viesse com a Lei de Deus, para confrontar sua carne, envergonhá-la e trazê-la ao arrependimento (2 Samuel 12). Portanto, a pregação da Lei não pode cessar enquanto houver carne e Adão no mundo. 
Somente a fé nos torna livres diante de tudo. A fé nunca peca! Por outro lado, tudo que é praticado sem fé, por mais lindo que seja e ainda que pareça verdadeira obediência, é pecado e perdição. 
Quem crê cumpre a Lei natural. Quem não crê, não a cumpre de forma alguma. 
Então hoje percebemos a labuta de cristãos, em seu desejo de cumprir a Lei de Moisés e outras tantas inventadas, porque ainda não conhecem a dimensão da obediência livre que provém da fé. Deus não quer obediência exterior forçada, sem coração, porque isso não é obediência; é medo! Ele quer a legítima obediência, que começa no espírito, onde habita a fé. Em outras palavras, Deus quer o amor com o qual a fé se torna conhecida. Desse amor é que procede a verdadeira obediência.



Autoria: Carlos Alberto Leão.
Imagem extraída da internet.

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