sábado, 21 de outubro de 2017

O QUE É NECESSÁRIO PARA SER CRISTÃO?

"Visto que dizemos: a fé foi imputada a Abraão para justiça. Como, pois, lhe foi atribuída? Estando ele já circuncidado ou ainda incircunciso? Não no regime da circuncisão, e sim quando incircunciso" (Romanos 4:9-10).

A coisa que o diabo mais odeia no mundo é a pregação da justificação somente pela fé. Desde o início, ele opõe as obras à fé e estabelece uma antítese onde não há. Sua estratégia é fazer com que fé e obras pareçam coisas que se excluem e jogar uma contra a outra.
Não há uma antítese entre fé e obras. As obras manifestam a fé, assim como o calor manifesta o fogo, a obra revela o autor, o efeito indica a causa. Quando o diabo faz um ilusionismo e contrapõe fé e obras, as obras saem com a primazia, pois elas são visíveis. Mas que tipo de obra ganha primazia? Não aquela que é um continuum com a fé, mas aquela que está dissociada dela e que é condenável perante Deus, porque "sem fé é impossível agradar a Deus" (Hebreus 11:6). 
Então veja que o diabo tem um plano muito bem estruturado. Por meio desse plano, ele quer transformar a oferta de Caim em uma obra aceitável perante Deus. 
Quando dissocio a obra da fé, eu tomo a obra como algo intrinsecamente bom e aceitável perante Deus. Por mais que trabalhe minha argumentação, é inevitável que a obra assuma um caráter bom toda vez que me disponho a contrapô-la à fé. Ou a obra é expressão da fé e aceitável por causa dela, ou a obra é boa em si mesma. Não é possível uma conclusão diferente dessas duas, por mais hábil que um orador seja.
Pior ainda: quando a obra é contraposta à fé, conclui-se que a fé é algo ruim. Pois se uma obra inerentemente boa se opõe à fé, é evidente que a fé não é boa. Não é razoável opor algo bom a algo bom. Ou fé e obras caminharão juntas ou irão combater-se e mutuamente destruir-se. Não há outra possibilidade.
Já no tempo dos apóstolos, houve a necessidade de enfatizar a pregação da fé ou das obras, a depender do abuso que surgia. Entre os judeus convertidos que defendiam a primazia das obras, São Paulo pregou a fé. Entre os libertinos que defendiam a primazia da fé, São Tiago pregou as obras. Depois dos apóstolos, com os gnósticos vivendo uma vida dissoluta e fazendo-se passar por cristãos, os pais foram obrigados a enfatizar as obras. Mas a verdade é que fé e obras não devem andar separadas, pois se pertencem. Separar fé e obras é o mesmo que separar substância e acidentes, só é possível no âmbito da intelectualidade. 
Abraão foi justificado por Deus quando creu, antes de ser circuncidado. Noé também foi justificado sem a circuncisão. Abraão e Noé foram justificados sem o sábado e as cerimônias de Moisés. Ambos sequer eram judeus. Que relevância esse antigo argumento tem para os nossos dias? 
Muitos pensam que ser cristão é aderir à ortodoxia, batizar-se, receber a Eucaristia e penitenciar-se. Há muitos que creem ser necessário aceitar Jesus e confessá-lo perante os homens. Para essas pessoas, a fé não é suficiente, são necessárias obras. Mas que tipo de obra é essa que é desejável por si só? Querem apartar os acidentes da substância, separar o efeito da causa e pior: transformar a criatura em criador. Contra essas pessoas que vêm sobre nós, dizendo: Você não pertence à Igreja porque não foi batizado por nós, ou porque não recebeu a verdadeira Eucaristia de nós, devemos clamar: Idólatras, vocês transformam a verdade de Deus em mentira, adoram e servem à criatura em lugar do Criador (Romanos 1:25).
Circuncisão e sábado, se compreendidos como algo bom em si mesmo, descontextualizados da fé, tornam-se ídolos, simulacros da verdadeira circuncisão e do sábado. Também o Batismo e a Eucaristia, quando apartados da fé, tornam-se igualmente estátuas de barro, reproduções dos verdadeiros sacramentos. Isso porque é impossível separar fé e obras. 
Se eu disser que, além da fé, é necessário ser batizado, estou necessariamente substituindo o verdadeiro Batismo, que é obra de Deus e indissociável da fé, por um falso batismo, um ídolo, uma obra humana que é boa em si mesma. Um batismo que pretende complementar a fé e que, portanto, é bom em si mesmo, não é o verdadeiro Batismo, mas um ídolo. O mesmo raciocínio eu posso transportar para a Eucaristia, para a confissão, para a oração e para qualquer obra que a Igreja realiza.
Mas se fé e obra existem como coisas indissociáveis, é evidente que a Igreja não deve ser identificada por suas obras. É possível que as obras sejam ídolos, por estarem desprovidas de fé. Portanto, a identidade da Igreja não está na ortodoxia, no Batismo, na Eucaristia ou na confissão, mas sim na fé que resulta em ortodoxia, Batismo, Eucaristia e confissão. Sendo assim, ser Igreja é um mistério, vai muito além do que se pode ver.
Que sinal é proposto então para a Igreja? Só pode haver um sinal: a Palavra. Uma vez esteja a Palavra em uma sociedade humana, é impossível que não haja fé ali. E se há fé, há verdadeiras obras, porque fé e obras são inseparáveis.
Portanto, a identidade da Igreja não está na circuncisão, no sábado, no Batismo, na Eucaristia, em qualquer tipo de rito, em qualquer boa obra, mas na Palavra de Deus, de onde provém a fé, que necessariamente resulta em obras. Se se prega a Palavra de Deus, é certo que há fé. E se há fé, é certo que há sacramentos verdadeiros e boas obras, isso independentemente da sucessão apostólica, do papado e da ortodoxia.
Ser Igreja é um mistério que nem mesmo o diabo consegue decifrar. É por isso que a Igreja prevalece sobre as portas do inferno, apesar das inúmeras divisões que ele fomenta.
Para ser cristão, não é necessário mudar de igreja, acatar uma ou outra tradição, sujeitar-se ao papa, receber um novo batismo e comungar a verdadeira eucaristia. Não, tudo isso é idolatria! Para ser cristão é necessário tão somente crer.

Autoria: Carlos Alberto Leão.
Imagem extraída da internet.

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