domingo, 10 de setembro de 2017

FÉ E CRENÇAS SOBRE A EUCARISTIA

"Porventura, o cálice da bênção que abençoamos não é a comunhão do sangue de Cristo? O pão que partimos não é a comunhão do corpo de Cristo? Uma vez que há um só pão, nós formamos um só corpo, embora sejamos muitos, pois todos participamos do mesmo pão" (1 Coríntios 10:16-17).

O propósito desta publicação é analisar sucintamente a fé luterana acerca da Eucaristia e as crenças que coexistem com ela.
A visão verdadeiramente luterana acerca da Eucaristia é chamada de "união sacramental". Nós professamos que a Palavra da instituição deve ser interpretada literalmente. O pão se torna o corpo de Cristo, o vinho se torna o sangue de Cristo, sem que pão e vinho deixem de existir. 
O luteranismo autêntico rejeita a ideia de metabolismo ou transformação do pão em corpo e do vinho em sangue, por não haver respaldo escriturístico para isso. São Paulo nos deixa claro que o pão é a "comunhão do corpo" e que o cálice é a "comunhão do sangue". Nossa confissão é que o verdadeiro corpo de Cristo une-se ao pão de maneira milagrosa, assim como o sangue ao vinho. Não é uma presença local, mas sublime, inacessível à razão humana. Entretanto, essa presença não é menos verdadeira e concreta que a presença local. 
Nós, também, enfatizamos que a participação do corpo e do sangue é para a remissão dos pecados. Por meio da Eucaristia, recebemos o fruto do sacrifício de Cristo, que é a remissão dos pecados e a vida eterna. Para nós, a Eucaristia é para perdoar e salvar, ela não tem outro propósito.


A primeira crença envolvendo a Eucaristia é o simbolismo. Por nenhum outro motivo, senão pela incredulidade, alguns deram uma interpretação alegórica à Palavra da instituição. Para eles, o pão é um símbolo do corpo, o vinho é um símbolo do sangue. Não entendemos ainda qual a base dessa analogia, porque os defensores do simbolismo até hoje não concluíram se o pão simboliza o corpo natural de Cristo ou a Igreja. 
Quando dizem que ele simboliza o corpo natural de Cristo, recorrem a S. João 6, onde Jesus se apresenta como "o pão da vida", uma clara alusão à sua Palavra. Jesus afirma, nessa pregação, que "AS PALAVRAS que eu vos tenho dito são espírito e são vida" (S. João 6:63). Portanto, o "pão da vida" não é propriamente a Eucaristia, mas tudo aquilo que Cristo diz.
Por outro lado, quando afirmam que é a Igreja, recorrem a 1 Coríntios 10:16-17, querendo defender a ideia de que corpo, nesse texto, é a Igreja. 
Bem, glosar esse texto não é uma tarefa tão simples, como pretendem. Quando S. Paulo ensina que "o pão que partimos é a comunhão do corpo", ele se refere ao corpo de Cristo ou à Igreja? É necessário que esse ensino de S. Paulo seja harmonizado com a instituição da Eucaristia. Cristo deixou muito claro que o pão partido é seu corpo OFERECIDO, não a Igreja (S. Lucas 22:19-20). O corpo que Cristo deu aos apóstolos é o mesmo corpo que foi OFERECIDO na cruz, algo que a Igreja não fez. Portanto, é de se esperar que S. Paulo tenha em mente o corpo de Cristo que foi oferecido na cruz, não a Igreja. Além disso, como introduzir a "comunhão do sangue" na alegoria da Igreja?
Já no versículo 17, São Paulo afirma que os coríntios são um só corpo porque participam do mesmo pão, que é a comunhão do corpo de Cristo, o mesmo corpo que foi entregue na cruz. A ideia central do texto é que há uma unidade entre quem cultua e quem é cultuado. Há uma unidade entre os pagãos e os deuses que eles cultuam, assim como há uma unidade entre os cristãos e Cristo. Vejam que o texto não prova, de forma alguma, que o pão seja uma analogia da Igreja. São Paulo não faz uma comparação entre a unidade da Igreja e o pão, mas estabelece que a unidade da Igreja é CONSEQUÊNCIA da participação do pão, que é o corpo de Cristo, o corpo OFERECIDO.
Quando questionado sobre qual o proveito da Eucaristia, o simbolista não tem algo muito concreto a dizer. Afirma algo vago, como "fortalecimento da fé", porque não acredita que a Eucaristia tenha o poder de salvar. Pudera, que ato simbólico teria o poder de justificar? Ninguém pode ser justificado com base em obras. Tudo o que acontece na Eucaristia para um simbolista está dentro do âmbito da intelectualidade, que é uma obra humana. Por esse motivo, ele não tem segurança alguma naquilo que está fazendo, não é algo em que pode confiar, pois só há o agir humano, no qual tudo é incerto.
Se o simbolista não tem o respaldo escriturístico, ele também não tem a história da Igreja e a pregação dos Pais a seu favor. Muito pelo contrário, a história da Igreja e a pregação dos Pais testemunham que Cristo está substancialmente presente na Eucaristia. Já no segundo século, Santo Inácio de Antioquia, em sua Epístola aos Esmirniotas, afirmou:

"Eles se afastam da Eucaristia e da oração, porque não professam que a Eucaristia É a carne de nosso Salvador Jesus Cristo, que sofreu por nossos pecados e que, na sua bondade, o Pai ressuscitou".

Um simbolista prefere dizer que a Igreja esteve sempre errada, desde o seu início, desde o período apostólico, a admitir seu erro.


Desamparados pelas Escrituras e pelos Santos Pais, alguns simbolistas foram obrigados a colocar o corpo e o sangue de Cristo substancialmente na Eucaristia, mesmo a contragosto. Foi então que surgiu o espiritualismo.
O espiritualismo afirma que comer o pão é participar espiritualmente do corpo de Cristo, que está localmente no Céu. Igualmente, beber o vinho é participar espiritualmente do sangue de Cristo, que está localmente no Céu. 
Se o simbolismo ao menos tentou provar-se como verdade por meio das Escrituras, o espiritualismo pouco se interessou por isso. Os argumentos dos espiritualistas são os mesmos dos simbolistas, eles recorrem aos mesmos textos e apresentam a mesma exegese. Eles não se sentem movidos a ter que provar sua opinião pelas Escrituras. Contentam-se com a razão, que se deixa inspirar por Platão. Para os espiritualistas, é a autoridade da razão que autentica sua crença, não há necessidade de se recorrer às Escrituras.
O espiritualismo é uma manifestação do neoplatonismo cristão, que despreza a matéria como algo ruim e almeja a imaterialidade. O comungante espiritualista é movido a intelectualmente abandonar a matéria corruptível e elevar-se ao Deus incorruptível. Tudo é permeado pela intectualidade e pela contemplação. Embora afirme que é uma comunhão espiritual, trata-se de um claro esforço intelectual de sublimar a matéria e elevar-se ao mundo da incorruptibilidade, que é o Céu.
Debater o espiritualismo com as Escrituras não é um problema em si, porque eles não querem provar seu ponto de vista com base nelas, mas na razão. Então, que fiquem com a razão e continuem batendo na tecla que não é razoável que coisas tão sublimes se rebaixem a esta nossa realidade precária. Só cuidem para que não tragam esse mesmo raciocínio para o dogma da Encarnação do Verbo, onde é impossível um rebaixamento mais profundo. Quanto a nós, luteranos, ficaremos com o Sola Scriptura.
Por falar em dogma da Encarnação, é notória a dificuldade dos espiritualistas a respeito, porque não admitem que Cristo seja sempre Deus e homem. Estão dispostos a admitir que Cristo seja Deus e homem em um lugar que chamam de Céu. Fora desse lugar, Cristo não é humano. Portanto, há duas pessoas em Cristo: uma humana e outra divina, que se sobrepõem somente no Céu, de maneira local. Em resumo: são todos nestorianos!
As Escrituras nos ensinam que Cristo está à direita de Deus (Efésios 1:20) e no Céu (Atos 3:21). Por direita de Deus devemos entender a sua onipotência (Salmo 118:16), que está em todo lugar e, ao mesmo tempo, em lugar algum. A direita de Deus não está sujeita ao tempo e ao espaço, não é um lugar, é uma realidade incorpórea. Também não tenho nenhuma prova escriturística que o Céu seja um lugar, como os neoplatônicos pretendem desde sempre. Mas supondo que estejam certos, que o Céu seja um lugar específico, o que devo alegorizar: o Céu ou a direita de Deus? Se for preciso alegorizar, o que não precisamos, que alegorizemos o Céu, porque a direita de Deus é algo muito maior que um suposto lugar. A direita de Deus é um atributo dele e não podemos alegorizar a essência de Deus. 
A pergunta que se segue é: Como pode um homem ser onipresente? Lembremo-nos que esse homem é Deus e tudo pode. Mas deixemos isso para os curiosos, porque não é função da Igreja explicar, somente confessar.

Autoria: Carlos Alberto Leão.
Imagens extraídas da internet.


Nenhum comentário:

Postar um comentário

Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.