quinta-feira, 7 de setembro de 2017

FAÇAMOS O HOMEM À NOSSA IMAGEM

"Em verdade, em verdade te digo que, se alguém não nascer de novo, não pode ver o Reino de Deus" (S. João 3:3).

Nascido da semente da mulher, ou seja, sem colaboração do homem, Jesus é a criação refeita de Deus. Nele se encontra o verdadeiro homem, com o qual Deus está unido em uma só pessoa. Nele está a dignidade humana, que deriva da dignidade do próprio Deus. É ele a verdadeira Imagem de Deus, aquele no qual habita toda a plenitude da Divindade, aquele homem que se pode chamar de Deus, porque de fato é. Adão, da maneira como foi criado, não era o protótipo da verdadeira humanidade, mas a prefiguração do Senhor Jesus. O protótipo da verdadeira humanidade é Jesus.
O primeiro indício da Encarnação de Deus se encontra no ato criador do homem: "Façamos o homem à nossa imagem, conforme a nossa semelhança" (Gênesis 1:26). Deus tinha em si mesmo o modelo para a criação do homem, porque ele próprio haveria de se encarnar no tempo, embora seja homem desde sempre, na eternidade, onde não há antes ou depois. 


O propósito redentor de Deus está intimamente conectado à sua própria humanidade. O verdadeiro homem se encontra unido pessoalmente a Deus, imerso no mistério da Trindade, compartilhando a Justiça de Deus e tudo aquilo que lhe é próprio. O desejo de Deus para com a humanidade caída é elevá-la à dignidade que ele lhe conferiu desde a eternidade. Do Antigo ao Novo Testamento, toda a atividade de Deus na história humana visa a isso. 
A glória de Deus está intimamente conectada à glória do homem. Por isso mesmo, Deus clama que o louvemos por meio de obras de misericórdia, porque quando o homem é honrado e dignificado, Deus é honrado e dignificado. Por outro lado, quando o homem é profanado, Deus é igualmente profanado. 
Oseias prega: "Pois misericórdia quero, e não sacrifício, e o conhecimento de Deus, mais do que holocaustos" (Os 6:6). E Miqueias: "Agradar-se-á o SENHOR de milhares de carneiros, de dez mil ribeiros de azeite? Darei o meu primogênito pela minha transgressão, o fruto do meu corpo, pelo pecado da minha alma? Ele te declarou, ó homem, o que é bom e que é o que o SENHOR pede de ti: que pratiques a justiça, e ames a misericórdia, e andes humildemente com o teu Deus" (Mq 6:7-8). Por fim, Jesus: "O Rei, respondendo, lhes dirá: Em verdade vos afirmo que, sempre que o fizestes a um destes meus pequeninos irmãos, a mim o fizestes" (S. Mateus 25:40).
Portanto, Deus submete todo o conhecimento acerca dele ao conhecimento do homem e todo o seu serviço ao serviço do homem. Qualquer prática religiosa que se volta para um Deus não encarnado ou transcendente é ímpia. A verdadeira piedade busca Deus na concretude da humanidade e não na especulação ou meditação solitária. Quer conhecer Deus? Então conheça o homem, porque é no homem onde Deus está e onde ele quer ser encontrado. Não é no campo das ideias, mas no seio da Virgem. Não é na abstração, mas na Igreja, no Sagrado Ministério e nos sacramentos.
Como íamos falando, o propósito redentor de Deus está atrelado ao seu conhecimento da humanidade. Ele quer que nossa humanidade seja purificada de suas mazelas até configurar-se à verdadeira humanidade, que está nele mesmo. É como se o "façamos o homem à nossa imagem e semelhança" se estendesse no tempo e passasse por toda a história humana, por todas as eras, em que Deus revela seu desejo de fazer o homem à sua própria semelhança, tendo Jesus como modelo eterno.  
O novo nascimento pregado a Nicodemos nada mais é do que ser criado por Deus, não segundo o modelo de Adão, mas de acordo com o modelo da verdadeira humanidade, que é Jesus. A Palavra: "Em verdade, em verdade te digo: Quem não nascer da ÁGUA e do Espírito não pode entrar no Reino de Deus" (S. João 3:5) vem nos mostrar que o início da obra redentora de Deus está no Batismo, na água que é veículo do Espírito e que nos enche dele. O Batismo não é um ato momentâneo, mas é o princípio de uma nova criação, porque ele nos configura ao modelo de Cristo, o que não ocorre da noite para o dia, mas terá sua consumação somente na ressurreição dos mortos. 


Mas a pregação ouvida por Nicodemos vai além da ideia de um simples aperfeiçoamento humano perante Deus, que aliás é uma ideia muito popular entre os pagãos. Nicodemos ouve o seguinte: "O que é nascido da carne é carne; e o que é nascido do Espírito é Espírito" (S. João 3:6). Quem nasce de Deus é Deus, compartilha de sua Justiça e dignidade, ainda que não possamos entender o que isso significa e embora isso se dê no âmbito da fé, pois tudo o que vemos em nós é precariedade. Eu vejo em mim um animal, mas Deus me enxerga como a si mesmo.
Deus cumpre o seu "façamos o homem à nossa imagem e semelhança" por meio do Santo Batismo. Entramos na água como animais, saímos dela como Cristo, verdadeiro homem e verdadeiro Deus em uma pessoa indivisa. Perante nós mesmos, é um nascimento, porque temos toda uma vida de penitência pela frente. Mas perante Deus já somos o que ele gostaria que fôssemos, desde os tempos eternos: Espírito!

Santo Ireneu: "Nisto Deus difere do homem: Deus faz, o homem é feito. Aquele que faz é sempre o mesmo e quem é feito tem necessariamente início, meio, aumento e desenvolvimento. Deus faz o bem, o homem recebe o bem. Deus é perfeito em tudo, igual e idêntico a si mesmo, é por inteiro luz, pensamento, substância e fonte de todos os bens, enquanto o homem recebe o progredir e o crescer para Deus. Enquanto Deus é sempre o mesmo, o homem que se encontra em Deus progredirá sempre em direção a Deus" (Contra as Heresias, volume IV).

Autoria: Carlos Alberto Leão.
Imagens extraídas da internet.

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