"Porque todo o que é nascido de Deus vence o mundo; e esta é a vitória que vence o mundo: a nossa fé" (1 João 5:4).
Dias atrás, a esposa de um senhor de minha comunidade faleceu. Desde 2014, quando passei a frequentar os cultos dessa minha comunidade, soube que essa senhora estava muito enferma, debilitada e acamada, sendo cuidada por seu marido. Orava pelos dois, sem saber quem eram. O seu marido não ia aos cultos, só cuidava dela, o tempo inteiro. Disseram-me que foi um casal que muito bem fez à vida da comunidade. Entretanto, não os conhecia. Até que dias atrás soube da morte dessa senhora.
No domingo seguinte ao falecimento dela, apareceu um senhor triste e cabisbaixo na igreja. Enquanto eu tomava um café, aguardando o início do culto, ele puxou conversa comigo e comentou que havia muita gente nova na comunidade. Apressei-me em cumprimentá-lo. Então soube que ele era o esposo daquela senhora que havia falecido. Quis consolá-lo e busquei algum recurso, como filhos, por exemplo, mas eles não tiveram filhos. Ele estava sozinho desde o falecimento da esposa. Então recorri ao recurso do silêncio e continuo orando por ele.
Muita coisa veio à minha mente desde domingo passado. Esse senhor ficou ausente dos cultos por anos, cuidando de sua esposa. Quando ela faleceu, ele não quis mais ficar em casa, mas veio ao culto, ouviu a Palavra, comeu a Palavra e bebeu a Palavra, em busca de saciedade. Quanto aprendizado é possível extrair disso! Inclusive, estou comovido enquanto escrevo.
Por anos, aquele senhor vivenciou toda a sua espiritualidade à beira do leito da esposa. Ela foi o seu alimento espiritual diário, o sinal da Palavra de Deus, sua Eucaristia e Batismo, sua Pregação. Não tinha como vir aos cultos, mas o culto estava ao lado dele, sobre uma cama, e ele permaneceu de pé, por nenhum outro motivo, senão pela Palavra de Deus.
Cristianismo é isso! Tudo o que acontece nos ritos só encontra seu significado fora deles. É necessário ser cotidianamente cristão, porque nosso Deus é um Deus encarnado, é um Deus humano, revestido de sociedade, cultura, história, dilemas, alegrias, dissabores. É um Deus revestido de gente! E somente no cotidiano, em nossas interações mútuas e com o mundo em geral, é possível comungá-lo. Ele está no pobre, na mãe, na viúva, no órfão, no governo, em tudo o que há de muito humano, concreto e vulgar. Para encontrar esse Deus, não é preciso fechar os olhos e voltar-se para a interioridade, mas é necessário abrir os olhos, olhar atentamente para os lados e, principalmente, para o próximo. Esse senhor não permaneceu faminto quando, por motivo de necessidade, teve de se afastar dos ritos, porque a Palavra de Deus estava em sua própria casa.
Não estou querendo desvalorizar os sacramentos e o ministério da Igreja. Esse senhor recebia visitas pastorais e comungava regularmente. A questão é: o rito por si nada vale se meu Deus não for humano, se eu não recebê-lo como homem e como Igreja, como cidadão do mundo, como pedra viva, como sal da terra e luz do mundo. O cristianismo falhou quando entendeu que a vida mística deveria ser fora da sociedade, num deserto, num lugar isolado. Foi Lutero que resgatou a ideia de vida mística em família e em comunidade, no ordinário da vida, e creio que nada é mais luterano que isso.
Por fim, admira-me ver como a fé resiste a qualquer argumento racional. Afirmar que Deus opera tudo é fruto do intelecto. Eu posso dizer sempre, intelectualmente: Deus opera tudo em todos, tudo colabora para o bem dos que amam a Deus, só é possível confiar em Deus porque nada foge ao seu controle. Mas a fé não tem nada a ver com essas explicações. A fé não dá a mínima a explicação alguma. Ela simplesmente confia e prossegue. É a noiva cercada de muitos convivas, mas que só enxerga o noivo.
Ninguém tem o poder de deter a fé, nem o mundo, nem o diabo, nem a morte. Ela é surda e essa surdez é sua fortaleza. Ela não é estimulada por argumentos, nem desestimulada por eles. Por isso mesmo, a fé está livre de todas as manipulações possíveis. É evidente que nosso intelecto é passível de manipulação, mas nossa fé ninguém pode com ela, por isso ela segue invicta e haverá de nos conduzir ao Céu.
Ninguém tem o poder de deter a fé, nem o mundo, nem o diabo, nem a morte. Ela é surda e essa surdez é sua fortaleza. Ela não é estimulada por argumentos, nem desestimulada por eles. Por isso mesmo, a fé está livre de todas as manipulações possíveis. É evidente que nosso intelecto é passível de manipulação, mas nossa fé ninguém pode com ela, por isso ela segue invicta e haverá de nos conduzir ao Céu.
Autoria: Carlos Alberto Leão.
Imagem extraída da internet.
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