quarta-feira, 18 de fevereiro de 2015

MORTE, SEJA BEM-VINDA!


"Levamos sempre em nosso corpo mortal a morte de Jesus, para que também a vida dele seja vista no nosso corpo" (2 Coríntios 4:10).

Será que algo nos perturba mais que a morte? É provável que não. Nossa alma tem horror à ideia de morte. Ela deseja sempre coisas elevadas, como perfeição e imortalidade. Queremos uma vida que impacte outras vidas. Queremos ser lembrados. Não queremos partir sem deixar pegadas que nos imortalizem. 
Em quase tudo o que fazemos, queremos a continuidade e a vida. Provavelmente é esta a razão que me leva a escrever.

"Não sou nada. Nunca serei nada. Não posso querer ser nada" (Fernando Pessoa).

Aqui está um desabafo profundo demonstrando o horror que temos à ideia de morte, como sinônimo de fim e nada. De fato, não podemos querer ser nada. É intrínseco ao homem o desejo de existir, nem que seja na lembrança dos outros.
Mas reflitamos um pouco sobre o significado da morte. Ela de fato nos conduz ao nada, ao não ser?
Somos seres imperfeitos que buscam a perfeição. Ora, tudo o que é imperfeito terá que passar por sucessivas mudanças para chegar à perfeição. O velho tem que morrer para ceder lugar ao novo. É então que somos confrontados com a morte como algo necessário, pois sem ela as mudanças são impossíveis. Se o velho não morrer, não haverá novidade nem mudança. Permaneceremos os mesmos. No entanto, almejamos a perfeição. Por isso, mesmo sem saber, sofremos a morte a vida toda, em busca de melhorias.
Vivemos em um universo marcado pela ciclicidade. Algo necessariamente tem que morrer, para ceder lugar ao novo, em cada ciclo. Portanto, sem morte, os ciclos não se fecham e a renovação não acontece. É assim que o ocaso para um é a manhã para outro. O término de um dia é o começo de outro. O erro é o princípio do acerto. E assim por diante.
Então concluo que a morte é boa em si mesma, porque abre espaço para mudanças e possibilita recomeços. A morte não deve ser associada ao nada, mas ao reinício. Ela está a serviço da vida.
Quando não aprendemos a compreender a morte como algo benéfico, essencial para nosso aperfeiçoamento, a existência se torna um fardo insuportável, porque a morte está sempre presente. Causa repulsa à alma a ideia de ter nascido para a morte, para o fim e para o nada. Quando, ao contrário, aprendemos a enxergar a morte como parceira da vida, ela se torna para nós algo belo, bom e desejável, ainda que incômoda.
Agora olhemos para nós mesmos e questionemos o que há em nós que precisa de recomeço.
Onde houver necessidade de recomeço, a morte terá que passar por ali. Caso contrário, não haverá mudança. 
É incrível como somos apegados às coisas e o quão comodistas nós tendemos a ser. Quantas vezes só saímos do lugar porque fomos visitados pela crise? Insistimos na manutenção do que somos e temos preguiça de crescer.
Quanta coisa está falida em nós? Enquanto insistirmos na vida do que está falido em nós, não provaremos a novidade e não cresceremos. Ficaremos estagnados.
Quando S. Paulo diz: "Pensai nas coisas lá do alto, não nas que são aqui da terra", ele nos conclama a sempre rever o que há de velho, obsoleto e danoso em nós, para que reparos sejam feitos. O que está me prendendo? O que está me privando de mim mesmo? O que está tornando pesada minha trajetória?
É então que a bendita morte deve entrar, para possibilitar o recomeço. Somente morrendo para o que somos é possível renascer para o que podemos ser.
Jesus não quer que permaneçamos parados naquilo que somos. Ele deseja morte constante, para que a ressurreição aconteça, de maneira que estejamos sempre em processo de renovação. Não é cristão ficar estagnado, acomodar-se aos defeitos, fechar-se em conceitos e impressões. Jesus não quer uma Igreja estática. 
As mudanças são necessárias, porque não somos perfeitos, e todas elas surgem da morte. 
Quaresma é um tempo de morte. Período litúrgico em que somos convidados a nos despojar de nossos excessos, daquilo que nos descaracteriza, de tudo o que disfarça nossa precariedade, para que possamos analisar com coragem nossa nudez, onde estão nossas limitações, nossas feridas, nossa essência. Só então saberemos o que precisa ser mudado em nós.
Que Deus nos ajude a detectar em nossa nudez o que precisa da morte, o que precisa deixar de existir, para que possamos recomeçar. Não queiramos reter o velho. Deixemos que o velho morra, para que venham o novo e o inusitado.
"Ou, porventura, ignorais que todos nós que fomos batizados em Cristo Jesus fomos batizados na sua morte? Fomos, pois, sepultados com ele na morte pelo batismo; para que, como Cristo foi ressuscitado dentre os mortos pela glória do Pai, assim também andemos nós em NOVIDADE DE VIDA" (S. Paulo).
Que nossa vida seja dinâmica, marcada por mortes e ressurreições, tendo sempre Jesus como referencial. Amém!


Autoria: Carlos Alberto Leão.
Imagem extraída da internet.



2 comentários:

  1. Hoje foi meu primeiro contato com o blog, mas já estou amando os textos e a forma como você trata os assuntos. Que Deus continue te inspirando nessa obra! Grande abraço.

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