domingo, 5 de fevereiro de 2017

PAPEL DA LEI NA IGREJA E SOCIEDADE - PARTE 1

"Porque o pecado não terá domínio sobre vós; pois não estais debaixo da Lei e sim da graça" (Romanos 6:14).

"Assim, meus irmãos, também vós morrestes relativamente à Lei, por meio do corpo de Cristo, para pertencerdes a outro, a saber, àquele que ressuscitou dentre os mortos, para que frutifiquemos para Deus. Agora, porém, libertados da Lei, estamos mortos para aquilo a que estávamos sujeitos, de modo que servimos em novidade de espírito e não na caducidade da letra" (Romanos 7:6).

"Mas, se sois guiados pelo Espírito, não estais sob a Lei" (Gálatas 5:18). 



Quando S. Paulo diz à Igreja que ela não está mais sob a Lei ou que morreu para a Lei ou está liberta da Lei, porventura ele desobriga a Igreja a viver segundo a Lei? Essa acusação S. Paulo sofreu por parte dos judeus. Ele foi acusado de antinomismo, quer dizer: quem é salvo por Cristo não precisa obedecer à Lei e, portanto, está autorizado a viver de maneira imoral.
Lutero também foi acusado de antinomismo quando resgatou a justificação somente pela fé. Até entre seus amigos houve quem o interpretasse mal, alegando que a Lei não combina com a fé e que deve se restringir à esfera civil, para reger os ímpios. É o caso de João Agrícola, que ensinou a Lei não ser incumbência da Igreja, mas do Estado. Para ele, a Igreja deve pregar somente o Evangelho e deixar a Lei para os magistrados. A esse ensino Lutero combateu arduamente, clamando: "Disso se conclui que por meio dessa esperteza o diabo não quer abolir a Lei, mas a Cristo, o cumpridor da Lei".
Esse tema nunca deixou de ser oportuno, pois afinal é a base do cristianismo e continua a causa do surgimento de inúmeras seitas. De um lado alguns querem sujeitar a Igreja à Lei, como ocorre entre os evangélicos em geral, com destaque para os adventistas, e por outro há quem deseja abandonar a Lei por completo, como ocorre entre os liberais, dentre os quais quero enfatizar os grupos que defendem a homossexualidade e a prática do aborto entre cristãos. 

"Que diremos, pois? É a Lei pecado? De modo nenhum! Mas eu não teria conhecido o pecado, senão por intermédio da Lei; pois não teria eu conhecido a cobiça, se a Lei não dissera: Não cobiçarás" (S. Paulo, Romanos 7:7). 

São Paulo ensina que a Lei é útil para nos revelar o pecado, de maneira a nos retirar do estado de presunção, fazendo-nos ver o quão pecadores nós somos. A Lei abate nossa soberba, obrigando-nos a desistir de nós mesmos e a procurar Cristo. É a Lei que me faz constatar diariamente que sou idólatra, que não respeito as autoridades, que sou assassino, adúltero, ladrão, tão ladrão quanto um bandido, embora seja visto pelo mundo como homem honesto. Ela me faz ver que sou um maldizente, um invejoso e que ardo em cobiça. Isso a Lei cumpre em mim diariamente e me obriga a buscar refúgio em Cristo, que é a minha Justiça.
Quando o cristão anda satisfeito consigo mesmo, é necessário que a Lei revele seu estado. Só assim ele irá se arrepender e buscar a remissão de pecados. 
O desprezo atual da Igreja pelos cultos, especialmente pelos sacramentos, é um desprezo pela remissão dos pecados. E por que desprezamos a remissão dos pecados? Por causa do antinomismo. Quando a Lei é desprezada, não há como a Igreja enxergar o que resta de pecado em si mesma e, sem pecado, ela passa a desprezar a remissão dos pecados. Toda a polêmica de Lutero em torno dos sacramentos é inimaginável nos dias de hoje, porque pouco valor a Igreja tem dado a eles, infelizmente. Mas volto a dizer: o desprezo dos sacramentos é desprezo do perdão dos pecados e uma das faces do antinomismo.
O desprezo da Lei gera um povo satisfeito consigo mesmo. Um povo satisfeito, por sua vez, não precisa da graça de Deus. Então para que culto e sacramentos? Isso constatamos na sociedade e na Igreja.
Portanto, a doutrina de S. Paulo, que foi defendida por Lutero, continua atual nos dias de hoje.


São Paulo também chama a Lei de boa, santa e justa (Romanos 7:12), porque ela nos ensina como amar. Nossa natureza profundamente egoísta precisa ser instruída pela Lei sobre o valor do outro e acerca de nossa responsabilidade para com ele. Os judeus e a Igreja temos a Lei que foi revelada a Moisés, mas é fato que a Lei não é uma possessão nossa. A Lei faz parte da razão humana e uma total depuração da Lei só seria possível no contexto da irracionalidade e bestialidade. O homem teria que abdicar da humanidade para ficar livre por completo da Lei. 
Não é isso o que vem acontecendo no mundo de hoje? O positivismo jurídico ensina que não há uma moralidade que seja intrínseca da natureza humana. Ele quer desvincular a justiça da metafísica, por considerar a metafísica uma invenção dos religiosos. Argumenta que a moralidade é relativa e uma construção histórica, política e social. Então, o que a lei civil determina passa a ser moral, não havendo um padrão racional para isso. Aqui está a face mais perversa do antinomismo, pois vai contra a razão natural, e abre caminho à bestialidade e à selvageria. Desse tipo de antinomismo brotaram o nazismo e outras formas de nacionalismo barbárico. 


Esse mesmo positivismo tomou conta da Igreja, que agora está em dúvida se o "não matarás" se aplica ao aborto ou se o "não adulterarás" tem algo a dizer contra a união homossexual. Para os cristãos de hoje, o pecado não é algo estabelecido por Deus, através de sua Lei, mas algo estabelecido pela sociedade, através de suas leis. Outro exemplo é a fornicação, que o mundo transformou em amor e passou a adotar como algo moral, e a Igreja foi atrás. Isso também é antinomismo. 


Então a Lei é útil para revelar o pecado e para ensinar o verdadeiro amor, que é a alma da moralidade. Isso é papel da Lei, dentro e fora da Igreja. Desprezar esse papel da Lei é antinomismo. 


Autoria: Carlos Alberto Leão
Imagens extraídas da internet. 


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